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sexta-feira, 6 de novembro de 2015

Não existe ''dom'' *** (breve continuação do texto ''Malcolm e os elásticos'')



Um dia desses eu tive uma conversa com o meu irmão mais velho sobre o tão comum e polêmico tema ''genética e ambiente''. Meu irmão mais velho é bem menos estúpido que o meu irmão esquerdista, ''o do meio'', ainda que como todo ''não-sábio'', demonstre suas fraquezas mentalmente/cognitivamente integradas de muitas outras maneiras. O tema da conversa foi ''existe ou não existe o dom'' ** O termo dom pode ser facilmente cambiado para ''talento''. Aquele que se conhece, mais do que outros poderiam fazer por si mesmos, terá grande chance de concordar comigo sobre a realidade do talento ou dom inato, sem falar do mais agudo de todos eles, o gênio. 

O verdadeiro autoconhecimento tende a se dar por causa de uma curiosidade natural quanto a si próprio, na tentativa de ampliar o conhecimento que tem sobre si. Se consiste em um ramo pouco conhecido da ciência, que por sua vez se consiste em toda a forma de observação/manipulação da fenomenologia que obedeça à regras e finalidades de natureza puramente lógicas, isto é, na tentativa de se entender a realidade com base em uma construção convergente de padrões intercambiáveis ou coerentes entre si. Para alguém que é muito autoconsciente (ou que apresenta grande disposição para enveredar por este caminho ou destino), a noção de que o ser não tenha qualquer influência sobre o seu comportamento e suas motivações, parece absurda demais. É uma incongruência sem eixo de direção coerente, uma bússola desregulada, de quem não sabe realmente o que está afirmando. Toda vontade precisa partir do próprio ser, mesmo quando não for plenamente consciente, aliás, quase nada daquilo que fazemos será, em um sentido hiper-literal, ''consciente'', justamente porque quando agimos, estamos nada mais nada menos do que expressando todas as nossas variáveis bio-cognitivas como abordagem reativa natural, respondendo ao atrito, reagindo apenas e com (base em) nossas respectivas realidades orgânicas. Ao nos expressarmos, inevitavelmente estaremos partindo de um ponto pseudo-cego de subconsciência. O simples fato de estar redigindo este texto poderia ser entendido como uma forma de subconsciência. Por que eu estou fazendo isso** Com que motivação** O único cenário de plena consciência e consequente livre arbítrio se daria em uma realidade improvável em que a consciência nascesse antes do sistema corpo-mente e pudesse decidir sobre seu destino, isto é, sobre a construção de suas próprias características bio-cognitivas.  O sentido da ação espontânea ou naturalmente reativa está em si próprio, é a causa e o efeito simultâneos, por meio de nossas clausuras naturais ou armaduras orgânico-cognitivas (que se consiste a vida), reagimos. O ser humano é singular por ser o primeiro a conseguir desafiar esta orquestra profundamente misteriosa que serpenteia todas as nossas ações, MESMO àquela que nos faz mais singulares e despertos da realidade que nos envolve e nos afronta. 

Este não-tão-breve texto que está um pouco fora do tema principal, se consiste em uma tentativa de mostrar-lhes primeiramente o quão profundo podem ser todos os impulsos naturais de reação, de maneira que, todo o comportamento será inevitavelmente ORIGINADO pelo sistema corpo-mente do ser. O que diferenciará um comportamento do outro, será o grau de prevalência ou correlação causal de cada um, isto é, da origem até a expressão/externalização. O comportamento instintivo se consiste em uma causalidade em relação às características bio-cognitivas, por exemplo, o voo do pássaro e suas asas, o andar ereto e a constituição bípede do ser humano, a tromba e o elefante, o rabo e o macaco, etc... As reações comportamentais variarão desde a corporal-sinestésica até à respostas que forem mais influenciadas pelo ambiente. As ''simples'' reações via características fisiológicas em atrito com o ambiente até às reações mais complexas e provavelmente a mais radical de todas será a tentativa de trespassar os desígnios naturais que nos foram 'impostos'' desde nossas ''fabricações'', da concepção até os últimos dias do nascimento, situação que o ser humano está mais perto de alcançar. 

O dom se consiste na manifestação do instinto/naturalidade/causalidade comportamental que poderá ou não ser influenciado pelo ambiente, só que de uma maneira diferente daquela que os behavioristas acreditam.

Em alguns casos, haverá a necessidade de que ''circunstâncias ambientais vantajosas'' possam contribuir para que certa habilidade e especialmente, dom ou talento, possa ser desenvolvida. O exemplo mais elucidativo seria a música, especialmente em relação aos instrumentos musicais. Uma criança que tem natural inclinação/disposição para gostar e aprender (ou mesmo, algumas vezes, apenas para aprender) e for exposta cedo ou precocemente familiarizada com o instrumento musical que melhor lhe agradar, é provável que se encontrará em grande vantagem do que uma outra criança hipotética, com mesmo talento natural, mas que nunca for exposta ou familiarizada com a aparelhagem necessária.

Outros exemplos abundam. Por exemplo, a exposição para conhecimento matemático avançado, que só poderia se dar por intermédio de livros. O que se deve ter em mente é que as crianças superdotadas (talentosas ou cognitivamente dotadas) e especialmente, as geniais e as sábias, já apresentarão vantagens biológicas/naturais em relação aos seus pares de mesma faixa etária e portanto, ao serem expostas ou, o que acontece na maioria das vezes, haver uma curiosidade/procura natural pelo objeto de interesse, apresentarão um desenvolvimento muito mais rápido de especialização, aprendizado. É interessante notar no entanto, que esta mesma realidade será menos logicamente intensa em relação ao gênio criativo, porque este comungará com dois estilos mentais tendenciosamente divergentes (mas não opostos), criatividade e inteligência analítica. O que parece óbvio pra mim, parece impossível de ser entendido ou mesmo aceito por uma extensa fração de ''cognitivamente inteligentes'', a de que deve existir uma relação de reciprocidade empática (que eu cunhei de empatia cognitiva... distinta da empatia emocional) entre o ser e o objeto que está sendo exposto para que possa haver uma procura natural e posterior desenvolvimento. E quanto mais instintivo, mais inato for este potencial, mais natural e divertido será o seu desenvolvimento, o esticamento dos elásticos, usando novamente a metáfora dos elásticos.

 Voltando ao meu relato pessoal. Durante a minha conversa com o meu irmão, ele, que advogou pela inexistência do dom, me disse que a prática precoce seria a explicação mais coerente para mostrar o porquê de algumas pessoas serem tão boas em alguma particular atividade cognitiva ou sinestésico-corporal do que outras. Então eu lhe contei sobre o meu déficit significativo em matemática e que desde sempre nunca gostei desta matéria. Ele usou Mozart, o gênio austríaco da música clássica, como exemplo, para explicar que se eu tivesse sido forçado a aprender matemática desde quando era criança, tal como parece ter acontecido com o compositor em relação à música, é provável que tivesse me tornado muito inteligente neste conhecimento. Tal como eu mostrei ou tentei mostrar no texto da ''Síndrome do Polímata'', me parece que a maioria das pessoas que são mais cognitivamente inteligentes, são mais propensas a bancarem os polímatas, isto é, aquele que acha que ''sabe de tudo'' ou ao menos em relação a uma grande variedade de conhecimentos, e especialmente em relação às ciências humanas.

Por que discutir sobre política e religião não é algo muito inteligente de ser feito**

Simples, porque todo mundo quando discute sobre política ou religião, sempre expressará SEUS PONTOS DE VISTA, suas respectivas perspectivas existenciais, e como eu tentei pedantemente mostrar acima, serão respostas instintivas, adaptadas a contextos culturais. As culturas humanas nada mais são do que representações refletidas de macro-padrões cognitivos (comportamentais, mentais e corporal-sinestésicos), metafórico-literalmente falando, existe um enorme espelho (cultura biologicamente refletida) a nossa frente e nós só ''podemos'' manter a direção de nosso olhar ''coletivo'' a ele (desprezando os verdadeiros inconformistas).  Discussões são prolíficas, debates são raríssimos. Todo mundo acha que pode falar sobre política, religião, comportamento, porque são fatores muito mais pessoais, muito mais comuns em nossos cotidianos. Mas na verdade, os 3 apresentam macro-padrões, são sistemas, podem ser divididos, hierarquizados, em outras palavras, nós podemos ver seus esqueletos, suas estruturas, e perceber que se assemelham a qualquer outro sistema, porque tudo aquilo que é lógico e sustentável (lógico não é o mesmo que racional) será sistemático e obedecerá a padrões que se retroalimentarão por tempo indeterminado. 

Portanto, ''mesmo'' em relação à fenômenos que nós vivenciamos a uma base diária, também se pode exatificar, dar-lhes precisão sistemática, porque é justamente aquilo que são. Perceber a realidade é descrevê-la e nada mais. Apenas com base na moralidade ou racionalidade humana, que poderemos aplicar algo a mais, tirando-lhe a alcova de ''lógico'' ou sistematicamente pragmático.

Voltando ao tema principal. Meu irmão, ao desprezar padrões hormonais, tipo de lateralização, tamanho do cérebro, quantidade e ''qualidade'' dos neurônios dentre outras características biológicas que nos fazem distintos, isto é, desiguais, concluiu que qualquer um poderia se tornar um Mozart, desde que fosse forçado precocemente a se dedicar à música. Eu não sei de onde que ele tirou isso mas talvez não seja de todo errado. 

O ser humano, talvez, possa ser comparado à uma bolha gelatinosa que pode ser esticada, mas que, quando o esforço for cessado, voltará a sua posição habitual, de inércia, especificamente se não for do seu feitio/naturalidade fazê-lo. Esforço exagerado sem qualquer reciprocidade empática em relação à atividade que está sendo praticada, é sobre-humano, doloroso e anti-natural. Se eu começar a estudar matemática, talvez eu consiga melhorar muito o meu parco conhecimento que tenho por agora. Mas se não houver uma disposição que possa cobrir este esforço sobre-humano a longo prazo, é provável que depois de um tempo, eu volte ao meu normal habitual e esqueça boa parte do conhecimento matemático que consegui.... memorizar** 

Na escola é muito comum disto acontecer. Alguns alunos tem o hábito de decorar a matéria antes das provas. No momento da avaliação, eles tendem a ''saber'' muito mais do que sabiam durante todo o período. Logo depois da prova, também é muito comum que se esqueçam de quase tudo que decoraram. 

Eu já fiz isso,  já fiz um esforço sobre-humano que me custou algumas horas. Me deixou de mau humor, reclamando do sistema escolar, do porquê de ser assim, de nos forçar a ser aquilo que não somos, que não estamos dispostos a sermos.

A escola acredita que todo mundo poderá se transformar em um polímata até o último ano do ensino médio se a abordagem pedagógica certa for aplicada. 

Aprender/internalizar está indissoluvelmente relacionado com a essência bio-identitária do ser. Aprender é o alimento do ser, tudo o que aprendemos, transformamos em parte de nossas identidades, deve ser encaixável, recíproco.

 Como eu falei no texto ''Malcolm e os elásticos'', pode-se amplificar alguns atributos cognitivos superficiais com a prática, como decorar várias contas matemáticas ou de física, mas decoreba NÃO É aprendizado. E ainda é importante separar o que é decoreba ou memorização pragmática/superficial daquilo que se consistir em memorização complementar, isto é, que é parte de um processo de aprendizagem natural ou auto-motivada e com potencial de expansão espectralmente coerente. Aprender é internalizar, é pegar pra si aquele conhecimento e vivenciá-lo, expandir disposições cognitivas naturais, em outras palavras, exercer o seu desenvolvimento e vivência naturais. 

Portanto, como resposta ao meu irmão. O talento ou dom existe, todos nós temos algum talento ou dom; existirão claras diferenças de nível quantitativo e qualitativo em relação a uma panaceia de habilidades, todas elas que serão naturais em sua origem, mesmo um emprego de telemarketing, tudo resplandece, causativamente ou correlativamente, às nossas variáveis e disposições bio-cognitivas. Quanto mais causal for a habilidade, mais instintiva será, mais natural e potencialmente desenvolvida se tornará. 

O melhoramento de algum talento não se dá apenas por pura repetição mas também pelo uso do verdadeiro fator g em sua melhor expressão, ou seja, a sabedoria, na arte de se fazer o melhor julgamento para certa situação e consequentemente se tornar mais perfeccionista. 

Eu duvido muito que se Mozart não tivesse tido um gênio natural para a música, que teria se tornado o compositor excepcional que foi. Enfatizar (apenas, se não parecer redundante) pelo ser está errado porque de fato, existe a necessidade de ''alguma'' independência/vontade para perseverar e melhorar em determinada atividade. Mozart não foi o gênio musical que foi apenas porque ele nasceu com esta disposição, mas porque ele usou a sua disposição de maneira esperadamente espetacular a ponto de merecer tal designação. A dimensão onde que os tipos humanos mais virtuosos se encontram é por deveras muito mais complexa do que em relação aos demais, por primar pela perfeição objetiva do entendimento quanto à fenomenologia, que quer indicar múltiplas perspectivas

Quanto mais genial ou mais agudamente virtuoso, maior será a presença/influência de fatores ambientais únicos, o acaso, por exemplo, para produzir uma linda poesia, única em seus versos e também em seu nascimento, em sua produção ou para ter ideias espetaculares de qualquer natureza. É por isso que é hábito entre nós, os criativos, de sempre escrevermos nossas ideias. Porque elas são tão únicas, não necessariamente no conteúdo, mas na maneira como que vieram, por meio da intuição, que não podemos simplesmente deixá-las seguir rente ao esquecimento. Naquele espaço e tempo únicos, um ser humano teve uma nova ideia, que parece rara ou única em sua natureza. Este é um exemplo visceral de fator ambiental único, de acaso, de algo profundamente singular que não depende apenas da biologia, mas ainda depende venalmente dela, porque precisa ser apropriada para que possa haver esta combinação única de fatores.

O garoto que ilustra este texto, nos mostra que não adianta tentarmos desenvolver qualquer habilidade, se ela não vier de maneira natural, tal como desenhar. Ainda pode ser possível usar a sabedoria cognitiva (enfatizada em suas atribuições cognitivas e desprovida do senso moral significativo, em seu estado natural) para tentar superar obstáculos que são naturalmente impostos pela natureza, mas ao se ter esta consciência ou se perceber esta possibilidade, será necessário que se tenha no mínimo astúcia, a ''pequena e pragmática sabedoria'', porque do contrário, será pouco provável que conseguirá enxergar oportunidades quando ''elas não se apresentarem'' de maneira explícita e óbvia pra você.

Da mesma maneira que eu nunca tive inclinação natural pra matemática, também nunca tive inclinação natural para as artes visuais, pelo menos em relação à categoria mais impressionante, a representação visual perfeccionista ou realista. Eu já tive e admito que tenho inveja daqueles que conseguem esboçar com tanta facilidade desenhos de grande beleza e perfeição. Ter vontade, mas saber que não é bom, é apenas mais uma demonstração da sabedoria, do autoconhecimento. E é isso que parece separar de maneira mais precisa, os tipos sábios dos idiotas úteis.

Outro fator é a relativa arbitrariedade cultural do dom ou talento. Em nossas sociedades, moralmente hipócritas, certos dons evolutivos não são EXPLICITAMENTE apreciados até porque não haveria razão racional para fazê-lo especialmente sob uma ótico micro-interacional ou pessoal. Por exemplo, a astúcia natural de muitos tipos anti-sociais como os psicopatas de alto funcionamento. Outros tipos de talentos são tidos como hierarquicamente inferiores porque denotam ou refletem algo que se relaciona tanto com a disposição das classes sociais e laborais, quanto pela predominância da moralidade hipócrita, a moralidade subjetiva, em nossos julgamentos. Portanto, tocar violino pode ser considerado como um dom, mas ser um perito na arte de se fazer sexo, não será, especialmente para a classe educada. Não espere por ''diplomas de superdotação'' para um ator pornô talentoso em seu trabalho, por parte dos ''neurotípicos'', porque ele não terá reconhecimento de fora de sua esfera de atuação (foderdimento) e vivência.

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