Minha lista de blogs

segunda-feira, 16 de dezembro de 2019

Inteligência e QI, domesticação e raciocínio

Inteligência e QI, domesticação e raciocínio

Quando nos deparamos com um texto excepcionalmente bem escrito, com palavras raras, que nem sabemos o que significam, geralmente temos a tendência de identificar o autor do texto como uma pessoa muito inteligente. É elementar, porque ter um vocabulário robusto e sofisticado sempre foi associado à inteligência. Nos testes cognitivos, ou de QI, esses aspectos verbais são os que mais se relacionam com o fator G, a tal partícula estatística que interliga os testes. No entanto, eu vou lhes mostrar que, talvez, o que parece um claro sinal de maior capacidade cognitiva, na verdade também pode estar mais relacionado com a domesticação.

Primeiro, precisamos falar um pouco sobre a linguagem. Vocês sabiam que a linguagem é uma convenção? O que é determinado como o certo e o errado de ser escrito, ortográfica e gramaticalmente, não é baseado totalmente na lógica. Por exemplo, a maneira como falamos tende a se dissociar da maneira como escrevemos, dependendo do sotaque. E isso NÃO É LÓGICO, porque criam-se regras gerais que são parcialmente negadas ou alteradas. A palavra ''aprende'' é uma dessas dissociações. O mais interessante é que muitos dos erros cometidos pelas pessoas na hora de escrever está baseado justamente nesse atrito entre a lógica e a convenção. Quando eu falo ''aprende'', na verdade, falo de acordo com o meu sotaque, ''aprêndi''. Pela lógica, tal como se fala é tal como se escreve, de acordo com a sonoridade dos vocábulos. Mas, os sotaques geralmente variam e, ainda foi convencionado que a única maneira ''correta' de se escrever essa palavra, até para diferenciá-la do ''aprendi'' [''aprendí''], é com seu término em ''e''. É um caso em que certa convenção se sobrepõe à sua própria regra ou lógica ''se escreve tal como se fala, de acordo com a combinação dos vocábulos''. Outro exemplo, que acho pertinente de ser usado nesse texto, encontra-se na língua inglesa, e é o uso do ''you are'', tanto para o singular ''você é'' quanto para o plural ''vocês são''. Ora, mas se existe o ''is'' para o ''é'', então por que é usado ''you are''? A lógica pura não explica isso, mas a lógica da convenção sim, e ela não precisa estar totalmente vinculada à essa primeira.

Memorizar uma convenção é o mesmo que ''memorizar leis ou regras'' impostas por terceiros ou coletivizadas por muitos. Tal como ''lavar as mãos antes de comer'' ou ''se sentar na cadeira durante a aula''. É fato que quando aprendemos algo, também estamos memorizando leis ou regras deste algo, de seu comportamento estrutural, já que todo conhecimento assim se constitui, aliás, tudo. No entanto, tem uma diferença aí, entre memorizar uma realidade concreta, forjada ou abstrata, e uma convenção ou determinada por outras pessoas, mesmo em relação à sonoridade das palavras, se o ''a'' terá um som mais fechado ou agudo, por exemplo. Estou concluindo, portanto, que uma boa parte da dita ''inteligência verbal'', não se consiste naquilo que a inteligência se caracteriza de modo mais significativo, que é o raciocínio afim de compreender uma realidade, mas na memorização ou ''raciocínio passivo'', no sentido de memorizar leis ou regras de convenção, isto é, de mostrar o quão obediente ou perfeccionista se está em relação às mesmas, e isso é domesticação ou comportamento domesticado.

Se os testes de QI se relacionam mais com os aspectos verbais, então pode ser que sigam similar realidade, em que, apesar de expressarem aspectos importantes da inteligência, também estão condensados de habilidades que são mais sobre domesticação ou capacidade de obedecer, internalizando regras de convenção, do que de raciocínio. A inteligência verbal, em sua qualidade, seria, ora pois, o raciocínio verbal, no intuito de compreensão das palavras, em sua aplicação cotidiana mais adequada, de reconceituá-las de modo mais preciso, ou de inventar novas [criatividade ou cognição verbal aprofundada], de preferência, palavras que não sejam sinônimos muito próximos de outras. A memorização além de uma capacidade de suporte ao raciocínio, portanto, também se consistiria em uma característica de domesticação, especialmente se for associada à internalização de regras de convenção. 

Por que [ainda] não existe um método filosófico?? E as múltiplas distorções da filosofia

Por que [ainda] não existe um método filosófico?? E as múltiplas distorções da filosofia



Se você tem ótimas habilidades verbais, vontade ou vocação para se auto declarar filósofo, paciência para ler alguns dos textos mais difíceis já escritos, apenas para constatar obviedades, capacidade de copiar este modelo obscuro de comunicação escrita, ego para dar e vender, novamente a paciência para se especializar em um ou mais de um filósofo do passado ou contemporâneo e decorar suas ideias principais, então já pode até tirar o seu diploma de filosofia em uma faculdade mais perto de você. Mesmo se você for um crápula, sociopata, emocionalmente estéril, histérico, enganador, etc.... Nada te impede de incorporar a marca "filósofo" e exibi-la como broche de sapiência. Já, se você for mais criativo do que o estudante típico de filosofia e tiver insights filosóficos genuínos então será capaz de ocupar uma vaga na lista de filósofos, de fato, que ou aqueles que produzem, conhecimento, desta natureza. Mas, mesmo neste caso, continuaremos a ver persistir o mesmo problema, porque você pode ter qualquer nível de caráter, o que importa é se consegue corresponder a cada uma dessas "exigências" para ser considerado como filósofo por outros filósofos. Parece muito fácil constatar que o filósofo deveria ser aquele que, antes de tudo, busca pela sabedoria. Mas existem alguns que já chegaram até a distorcer o próprio conceito da filosofia, dizendo que o filósofo é aquele que apenas inventa novos conceitos. Isso é parcialmente verdade porque muitas vezes precisamos criar novos termos quando conseguimos ou achamos que  desbravamos uma nova perspectiva, mas o "apenas" da frase é um erro absoluto, porque o filósofo não pode ser unicamente isso, já que a sabedoria não é apenas produzir novos conceitos. O nível daquilo que denominei de descaracterização arquetípica, da filosofia, como temos percebido, tem sido enorme, profundo, a tal ponto em que o típico auto declarado ou socialmente identificado como filósofo muitas vezes é insuficiente para alcançar as exigências do próprio termo-adjetivo, quer seja por falta de virtudes decisivamente autênticas ao ofício, ou pelo excesso de vícios que o renegam com veemência. Das muitas razões para isso eu acho que a inexistência de uma base comum de um método, tal como a ciência apresenta, é um dos principais motivos para esse estado lastimável que se encontra a filosofia. Sem uma base comum, qualquer um pode, se apresentar as características acima, se definir como filósofo, aliás, esta lista de cumprimentos estéreis com o compromisso filosófico real, que foram alçados como condições para adentrar à classe daqueles que deveriam representar os verdadeiros pensadores profundos, devotados na labuta do melhor pensamento. Para entender o porquê disso tudo achei interessante colocar ciência e artes nesta análise. Para quem não nasceu com essa fraqueza é fácil perceber que as mitologias são obras artísticas e que se diferenciam de outras obras quanto ao seu teor e significação dada pelo social ou coletivo. Mas, continuam sendo obras artísticas ou de fantasia. Considero a filosofia como uma mistura ideal entre as artes ou nossa necessidade de entretenimento, de distração, e as ciências, ou nossa necessidade de compreender o mundo em que vivemos para sobreviver. Quando o ponto de sua receita é ultrapassado, a filosofia pode ser tomada pelas artes ou pelas ciências. A filosofia ou filosofias que excedem o materialismo, aspecto característico das ciências, é porque foram dragadas pelas mesmas, se descaracterizando em relação ao seu ideal. E o mesmo quando são as artes que roubam ou ocupam seu lugar na sociedade. E o pior que podemos concluir é que esses dois processos têm sido constantes ou predominantes na história de atuação da filosofia, mesmo ao ponto de dizer que esta expressão sem base comum que dá maior atenção à sofisticação das palavras do que aos seus significados, quase que um braço da literatura, é a que tem sido a regra de sua prática. O pior acontece quando essa deformações do único caminho possível para a filosofia, são transformadas ou cooptadas para servir a interesses que são geralmente opostos à verdadeira ou nuclear prática filosófica, principiada pela sabedoria. 


 O ideal é que não existissem múltiplas filosofias, pasmem, quase sempre produto da falta de ponderação dos seus criadores, como quando um pensador enfatiza excessivamente o trabalho como virtude a ser seguida no dia a dia ou mesmo quando o faz em relação ao hedonismo, se ambos, sem o devido equilíbrio, poderão causar problemas como no funcionamento da sociedade, de maneira geral. Essas filosofias são, em sua maioria, reflexos dos seus próprios criadores e a priori isso não deveria ser de todo condenado já que é preciso começar de algum lugar  e todo indivíduo começa por si mesmo, porque a subjetividade nos é primária. No entanto, deveria haver um método que enfatizasse os aspectos mais centrais do melhor pensar, tal como um filtro necessário, com a verdadeira marca filosófica. E, como já constatamos, se existe um método então não é baseado no que é essencial para a sabedoria. E se chegou-se a pensar em métodos mais condizentes com a prática, continuaram como métodos teóricos, até mesmo por terem sido escritos sem o devido vínculo com a prática por meio de exemplos ou mesmo de adota-los na elaboração de novos sistemas capazes de superaram em qualidade os vigentes, por exemplo, os atuais sistemas econômicos. O processo de descaracterização arquetípica é quando não ocorre uma plena correspondência entre prática e teoria ou entre expectativa ou idealização e realidade. Por exemplo, o médico que não atua como tal, que ao invés de curar ou tratar, mata ou piora o estado de saúde dos seus pacientes. O filósofo, e talvez desde há muito tempo, mais adoece o seu paciente do que o cura, mais prescreve excessos do que a verdadeira ponderação, que é o verdadeiro tratamento. O resultado de tanta negligência com o que é básico é monstruoso, em que a filosofia se transmuta desde graves distorções ilusórias da, daquela realidade, que deveria ser a sua alçada primordial, com as religiões ou mitologias, até suas versões mais materialistas, se é que podemos chama-las de versões mediante o nível sofrível de correspondência. Esse segundo grupo, menos do que uma distorção grave ao ponto da ilusão, se caracteriza ou se dá a partir de uma ênfase significativa na periferia do corpo filosófico de trabalho, em que a sabedoria, seu núcleo mais importante, é sumariamente desprezada, ou quando dizem buscá-la mas o resultado chega a ser pior do que seu desprezo, e domínios derivados como a fenomenologia são transformados nos novos centros enquanto que são claramente periféricos. Desta maneira, pode-se produzir muitas teorias no mundo abstrato das palavras sem se preocupar com o sacrifício mas também com a benção que seria tomar a sabedoria como construção teórica e prática, derradeira. A filosofia se tornou a rainha das subjetividades, sua significância foi reduzida mesmo a estilos particulares de vida ou à capacidade de alcançar sucesso pessoal em um mundo mundano que a renega. O método filosófico reorganizaria, ou mesmo, organizará a filosofia, já que parece nunca ter sido plenamente feito, buscando tornar essa sua diluição grave em um erro prolongado do passado, que perdurou por muito tempo, em um passado que por enquanto, ainda vivemos, e pasmem, causado pelos próprios filósofos, e também por variedades de tipos de sub-filósofos. Naquilo em que contribuíram não há muito o que dizer se não agradecer pelo trabalho. Mas naquilo em que negligenciaram  há de se apontar para que a sabedoria comece a ser praticada não apenas para ou em direção ao outro mas começando para si mesma, e portanto, para eles mesmos. Então, para o começo do método é importante buscar destrinchar o conceito que lhe é mais caro ou fundamental, o da sabedoria.