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segunda-feira, 8 de maio de 2017

A diferença entre o ''Rain man'' e você, e nós...

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Eu já havia comentado, algumas e esparsadas vezes, que as diferenças entre os portadores da Síndrome de Savant e a maioria das [outras] pessoas são bem menores do que imaginamos, porque afinal de contas, parece que todo mundo tem uma tendência para a especialização, em maior ou menor grau de intensidade... Eu já usei o termo ''savant de alto funcionamento'' para me referir, diga-se, de maneira derrogativa, em relação aos pseudo-inteligentes ou ''inteligentos'', aqueles que estão dotados de maiores capacidades intelectuais secundariamente importantes [auxiliares] no que diz respeito ao raciocínio, isto é, as de '' especialização cognitiva'', como as capacidades verbais e aritméticas, só que desprovidos de igual ''superioridade' em relação às capacidades intelectuais decisivas, como por exemplo o meu neo-conceito ''compreensão factual'', que é advinda da racionalidade.

Pois bem, o savantismo é marcado não apenas por uma super-especialização, mas também por um cenário oposto em relação às faculdades mentais gerais, corroborando para a famosa e simples descrição do tipo: ilha de ''genialidade' ou excelência, em um oceano de deficiência severa

E não é que ''nós' também não estamos um pouco assim* Isto é, somos ou tendemos à especialização [e alguns à super-especialização], só que também a sermos menos capacitados de maneira geral. Quando eu falo de ''maneira geral'' eu não me refiro apenas àquilo que os testes cognitivos geralmente mensuram, mas em relação à operacionalidade geral, e claro, contextualizada, no mundo real. 

Usualmente desejamos ou cremos que podemos superar os nossos limites e quando de fato atingimos o máximo de nosso potencial em relação à certa particularidade acreditamos que isso se consistiu em uma ''superação'', enquanto que na verdade, foi apenas o alcance maximizado de um potencial, remoto ou mais acessível, que já existia. Nada vem do nada, como se fosse um milagre. Por exemplo, se uma pessoa com câncer começar a melhorar abruptamente de sua doença, isso não significa que foi um milagre, isto é, que um ser divino, despertou de seu eterno sono de beleza e resolveu ajudá-la, mas que algo que não funcionava bem em seu organismo voltou a operar de maneira correta, por alguma razão biologicamente explicável, resultando neste acontecimento que pode ser categorizado como ''extraordinário'', por ser mais raro e também por ser de uma natureza espetacularmente assimétrica. E esses potenciais máximos, já estão embutidos em nós desde sempre, desde quando começamos a existir, claro, desprezando eventos incomuns como uma injúria cerebral parcial que altera a composição cerebral sem danificá-lo de maneira significativa, e até tendo como resultado o aparecimento de talentos até então inexistentes. Também há de se pontuar que, como não são todos aqueles que sofrem injúrias cerebrais que passam a desenvolver novos e surpreendentes talentos, então, deve-se analisar a natureza anatômica tanto da injúria sofrida quanto do cérebro afetado, isto é, alguns cérebros, mediante certos tipos de injúrias, podem ser mais propensos a se configurarem de certas maneiras que os tornam subsequentemente mais talentosos ou especializados para diferentes tipos de tarefas, que antes não se manifestavam.

Uma mente intelectualmente saudável, verdadeira e idealmente falando, é capaz de: diferenciar causalidade de correlação, de encontrar as causas dos efeitos ou o oposto, enfim, de ''conectar os pontos'', sempre que possível, e mais, não fazê-lo quando não for o apropriado. Ser inteligente também é ser humilde o suficiente para aceitar que não é, em relação à tarefas ou dimensões factuais que os nossos instintos cognitivos não podem se estender além de níveis basais ou mesmo superficiais [relacionados com as capacidades cognitivas secundárias]. Saber é uma demonstração de inteligência. Aceitar que não sabe, também.

Os famosos ''Rain Man'' são excepcionais em suas áreas, geralmente muito limitadas, de ''especialização quase-natural''. Em compensação, a maioria dos portadores da Síndrome de Savant mal conseguem amarrar os cadarços dos seus sapatos. Analogamente falando, a maioria dos seres humanos, que não são portadores da Síndrome de Savant, são como ''savant amalgamados'', tanto em relação à especialização quanto à deficiência. O savant geralmente é muito deficiente, de maneira geral, mas muito excepcional, de maneira super específica. O homem comum, mas também todas as suas variações de tipo, qualidade e quantidade psico-cognitiva/extensão e peso, são ''super a especializados'' em certas tarefas, que a humanidade já inventou [dando-lhe aspecto técnico, apto para o aprendizado], mas também deficientes, de maneira geral. Enquanto que a grande maioria é capaz de, ao menos amarrar os cadarços de maneira que não fiquem soltos, em outros aspectos de extrema importância, que expressam cores características de comportamentos inteligentes, eles podem ser categorizados como ''deficientes'', claro que, não no mesmo grau de severidade que a maioria dos savants geralmente apresentam ainda assim, deficiência.  

Eu já comentei que o ser humano, por exibir um sistema sensorial ''mais' equilibrado [e ao mesmo tempo intenso], é capaz de compreender a verdade objetiva, de maneira igualmente mais equilibrada e portanto holística, integrada, do que os outros seres vivos. E que, no entanto, a partir do momento em que adentra ao mundo da verdade subjetiva ou abstrata, retrocede ao estado que é comum aos demais seres vivos, só que no caso deles se dá em relação à verdade objetiva/sensorialmente imediata, isto é, voltando a se especializar ou a entender a extensão da verdade objetiva, que se consiste a verdade subjetiva, de maneira mais assimétrica, tal como o cachorro faz em relação ao seu olfato muito apurado na apreensão e entendimento sensorial da concretude [verdade objetiva].

Portanto, estamos todos ou em sua maioria de savant amalgamados: com tendências para a especialização [naquilo que somos melhores, ou ''forças] mas com um oceano de deficiências, especialmente em relação à totalidade de nossas capacidades e de seus usos mais perfeccionistas. Isto é, não bastasse apresentarmos as nossas fraquezas específicas, em média mais do que desproporcional, também apresentamos fraquezas gerais, que se manifestam especialmente com base na essência da inteligência, que principia pelo autoconhecimento. Existe uma espécie de ideal de comportamento, cognitivo [e/ou mais intelectual] e afetivo [ou psicológico], isto é, existem ideais de respostas e percepções, e no geral, tendemos a não nos sair muito bem neste quesito essencial.

O sábio e o savant

O sábio apareceria como o quase oposto do savant, ao menos em termos de deficiência de operacionalidade. Enquanto que o savant exibe grave deficiência em suas capacidades mentais básicas ou essenciais, como por exemplo, sair de casa, ir até o centro da cidade, e voltar... até à capacidades mais intelectuais, como por exemplo, extrair de uma complexidade de fatores e assuntos, muitos deles que são mais distrativos do que informativos, a sua hierarquia, e com isso poder estipular o seu sistema de prioridades, basicamente a imagem maior, o sábio, especialmente em relação ao segundo exemplo, se consistiria em seu oposto, ainda que possa exibir, assim como a grande maioria dos seres humanos, maior tino para a especialização em alguma área, é fato que ele se especializará, com maior gana ou motivação e talento, justamente ''naquilo que mais importa'', no entendimento da realidade, e com base na hierarquia epicêntrica do ''comportamento'', e consequentemente também do pensamento, principiando por si mesmo, ou autoconhecimento, e se estendendo ao conhecimento dos padrões de operacionalidade [personalidade, temperamento, etc] dos outros seres, humanos e não-humanos, também em relação aos elementos abióticos, ao menos do seu conhecimento mais básico, e por fim, a dinâmica que perfaz a macro-realidade, entre ele, os elementos vitais, materiais e fenomenológicos de interação. A continuidade da apreensão da verdade objetiva tem sido evitada ou abortada por causa dos sistemas de crenças humanas, que ao invés de terem continuado este processo, simplesmente o pularam, criando um vácuo de entendimento, sem falar que, como o processo seletivo do homem tem se dado de maneira parcial porém ainda assim significativamente aleatória, sem maior ênfase em critérios qualitativos, e com base em pressões seletivas que continuam a selecionar o ''adaptável'' de curto prazo e raso entendimento factual, para os ambientes sociais, então o ideal de inteligência também tem sido distorcido e evitado ao máximo, se as grandes civilizações preferem servis cognitivamente úteis do que de pensadores intelectualmente úteis, que inevitavelmente acabarão lhes forçando maior igualdade e justiça e como consequência, mais conflitos, diga-se, que podem ser decididamente fatais à perpetuação de elites moralmente idiotas no poder. 

O savant se especializa de maneira intensa na quase totalidade das vezes naquilo ''que menos importa'', ou que tende a ser de natureza recreativa, e portanto precisa ser cuidado por outras pessoas, como uma criança pequena, devido à sua condição de deficiente predominante e severo.

O sábio foca naquilo que mais importa, e mesmo que muitas vezes, por ser tão cronicamente mal-adaptado em sociedades estúpidas, tenda a se tornar dependente dos outros, isso ainda não significa que não terá talento de sobra para lidar com a complexidade do mundo. O problema ou nem tanto assim um problema, é que ele muitas vezes caminhará para desprezá-lo por completo, por causa de sua condição permanente de ''depressão existencial'', onde que começará a construir o seu mapa da realidade. 

O savant não sabe como agir com as outras pessoas, por causa da severidade de sua deficiência. O sábio sabe, mas custa-lhe demasiadamente retroceder ao estado de inteligência artificial que os outros costumam se encontrar, sempre preferindo pela idealidade, quase um sinônimo para ''verdade'', do que para acatar cada subterfúgio estúpido que abundam em mentes menos sábias.

E entre os dois, encontramos a maioria.  


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