Todo mundo fala em "influência genética no comportamento" mas talvez, seja de melhor tom, também falarmos em "influência do instinto no comportamento". Se você e eu não somos geneticistas então o instinto aparece como uma maneira muito mais prática de se entender quais são as influências que produzem os nossos comportamentos do que ''os genes''.
Primeiro vamos buscar pelo conceito, diga-se, simples, do termo principal deste texto: instinto.
O que é o instinto*
Segundo a wikipédia, o instinto são predisposições inatas para a realização de determinadas sequências de ações (comportamentos) caracterizadas sobretudo por uma realização estereotipada, padronizada e predefinida. Ainda segundo a wikipédia, o instinto é um comportamento característico dos animais, e me parece que não incluíram o ser humano aí.
O comportamento instintivo como eu já comentei, de acordo com as minhas concepções capengas sobre o termo, se baseia basicamente no pensamento e ação simultâneos. Evidente que, quando agimos, é porque durante a ação, também pensamos simultaneamente em sua execução. Por exemplo quando coçamos a mão. Eu não diria que o instinto se consistiria em um ''comportamento involuntário'', tal como acontece com as batidas do coração, porque mais parece ser um meio-termo entre o comportamento involuntário e o comportamento deliberado, voluntário ou supra-consciente. É o que eu estou fazendo ''agora'', redigindo este texto. Eu estou sendo, indiretamente instintivo, porque estou acessando os meus conhecimentos internalizados sobre ortografia, gramática [kakakakaka], composição ou organização das palavras, para criar frases coesas [tentativas, diga-se], acessando também os meus [parcos ou parquidérmicos] conhecimentos nessa área, visando com isso, não apenas produzir um texto coerente, mas também com conteúdo específico e relativamente bem trabalhado. Ação/pensamento simultâneos estão resultando neste texto. Eu penso muito rapidamente no que vou escrever, que se dá de maneira intuitiva [que eu qualifiquei como o estilo de pensamento instintivo], e descarrego esses pensamentos em palavras, exatamente como eu estou fazendo agora. Creio eu que, não exista comportamento sem instinto, e que, as diferenças entre ações/reações completamente instintivas e as mais deliberadas, se dão a nível de intensidade, em o quão ''automático'' que estão. O instinto seria a base para o comportamento, por isso que, não há como termos, metaforicamente falando, um prédio sem um solo que o acomode.
O instinto não é apenas ''um comportamento de animal'', porque nós, seres humanos, não temos total acesso ao livre arbítrio, como muitos ainda teimam em afirmar, ainda que estejamos no processo, no meio do caminho para que, talvez, no futuro, a humanidade possa se tornar ''mais livre'' de suas taras instintivas mais problemáticas ou ao menos de dominá-las. O instinto não é apenas para a sobrevivência, ainda que, em ambientes naturais, a mesma se consista na demanda mais hegemônica, porque precisa ser constantemente acessada. Por causa do conforto [nem tão confortável assim, mas ainda um baita de um conforto] da civilização, podemos pensar em muitas outras coisas, diga-se, muitas delas frívolas, do que a própria sobrevivência, e isso parece explicar parcialmente o porquê de termos desenvolvido esta falsa impressão de que não sejamos tão instintivos assim como os outros animais ou seres vivos.
Confunde-se agressividade com instinto, como se fossem sinônimos, mas na verdade a primeira é um efeito [via seleção natural] do segundo, especialmente dentro de ambientes evolutivos altamente competitivos e perigosos.
Por causa de sua ''auto''-domesticação, o ser humano tem de fato deslocado a sua base instintiva, de uma ênfase constantemente alarmista, que é fundamental ou que tem sido fundamental para a sobrevivência no meio natural, para uma ênfase mais social. Por isso que ''temos'' desenvolvido sistemas de comunicação [línguas e vocabulários] tão sofisticados e sim, temos combinado /co-evoluído com eles, por meio das nossas capacidades de aprendizagem intuitiva/automática. Isto é, temos como base o instinto cognitivo, só que mais amalgamado ou flexível, para o aprendizado de novas ''habilidades''. Só que, essas ''novas'' habilidades já são derivadas das bases instintivas que estão disponíveis dentro de uma população, isto é, se consistem em sofisticações dessas bases.
Por exemplo, por que a grande maioria dos seres humanos aprendem tão rápido a falar uma língua ainda na primeira infância*
Primeiro porque nós já apresentamos pré-disposições para aprendê-la, isto é, a língua é um software porque se consiste em uma tecnologia cultural, que foi sendo gradualmente desenvolvida [de acordo com que o ser humano foi se tornando mais inteligente, e na verdade, pode-se dizer que esta se consiste na expressão do ápice deste processo, até agora] e passada culturalmente de geração em geração. Portanto as bases para apreendê-la, que tende a independer da língua [crianças transnacionalmente adotadas que aprendem a língua nativa dos seus pais adotivos, por exemplo], já estão fixadas, isto é, se consistem em partes dos nossos instintos, só que, amalgamados, em que, ao invés de nascermos ''sabendo'', como no caso de alguns filhotes de outras espécies que já nascem sabendo andar, nós nascemos com um potencial, e de acordo com que vamos nos desenvolvendo e sendo expostos à língua, nós vamos aprendendo a falá-la até mesmo porque o desenvolvimento humano tende a ser muito mais lento. Os animais que já nascem sabendo andar, o fazem porque boa parte dos seus desenvolvimentos se dá durante as suas gestações. Poder-sei-a dizer que, o instinto se consiste na manifestação direta ou no comportamento/expressão do organismo/forma, e que, quanto mais abrangente for o desenvolvimento durante a gestação, mais instintivo, a priore, o comportamento se tornará. É como se todo o desenvolvimento mental/cerebral e nervoso de um indivíduo já tivesse ocorrido durante a gestação, e quando nasce, ele não precisa aprender ''novas' habilidades, mas de ''apenas'' aplicar as suas habilidades em seu cenário de vivência buscando com isso sobreviver às suas intempéries.
Percebe-se que o instinto se consiste basicamente na auto-projeção da forma/organismo em direção ao cenário ou ambiente de vivência.
Mais intrínseco, inflexível e mesmo, automaticamente perfeccionista, for o comportamento, mais instintivo será.
Ok, nem sempre...
O instinto no caso do ser humano e de sua gama de comportamentos, seria, metaforicamente exemplificando, tal como um grupo de copos vazios de diferentes formatos ou ''potenciais'', ''esperando'' pra serem preenchidos. Nas espécies mais instintivas, os copos já estão cheios e não há o que preencher. Este tempo ou hiato, desde o nascimento até ao pleno desenvolvimento de uma intrinsicabilidade que, parece diferenciar o ser humano de sobremaneira em comparação aos outros seres vivos.
O instinto principia-se sempre pela base/auto-projeção do organismo via comportamento. Por exemplo, um indivíduo que é verbalmente superdotado. As suas bases instintivas ou intrínsecas, que também podemos chamar de pré-disposições, para aprender a falar e a escrever de maneira consistentemente correta, são uma de suas potencialidades que, progressivamente vão tomando a forma de ''realização pessoal'' [de potencial para realização ou ''potencial preenchido'']. Ele já nasce com esta ''base instintiva'' e de acordo com que vai ''superando etapas do seu desenvolvimento'', as suas habilidades verbais vão sendo, quase que, naturalmente desenvolvidas. O cérebro cresce, sofre uma explosão gradual de neurônios, as partes atreladas à linguagem, se desenvolvem mais, mesmo se for a partir de um ambiente que estiver fora do ideal.
Sem base não tem como haver desenvolvimento. Sem uma pré-disposição, facilidade ou potencial para ser preenchido, não há como desenvolver certa habilidade. A minha metáfora dos elásticos. Quanto mais elástico, maior o potencial. Quanto mais rígido for o elástico, mais difícil de desenvolver o potencial. Quanto mais fácil, natural de se aprender certa tarefa, mais intrínseco ao ser, mais instintivo.
Então o que não é instinto no comportamento** [mas que, como sempre, deriva dele]
O pensamento ''reflexivo' é provavelmente a característica mais distinta do instinto, ainda que, derive do mesmo, como todo comportamento, por se consistir exatamente em sua avaliação, isto é, nas espécies mais instintivas, ''o instinto corre solto'' e nunca é avaliado pelo próprio organismo. É como, outra metáfora, lá vai, se tivéssemos uma criança que sempre apronta das suas e os seus pais nunca a punisse pelo seu comportamento [cenário instintivo], e quando nós temos pais que de fato visam [tentar] educar o seu pimpolho traquinas e passam a vigiar as suas atitudes. A autoconsciência parece ser o começo do controle do instinto, que antes agia sem maior auto-crítica, e agora, pode ser re-avaliado. E claro que isso também quer indicar maior plasticidade no comportamento, maior capacidade de mudar de pensamento, de avaliá-lo, claro que, de maneira mais introspectiva.
Portanto, neste não tão singelo texto, eu tentei, vocês viram, explicar que, parece ser mais prático, entendível e mesmo útil buscar entender e aplicar o termo instinto em relação aos nossos comportamentos, em como que são construídos, de onde que eles vem, pra onde que eles irão, enfim. Genes são essas coisinhas que nunca vimos mais gordos. Precisamos voltar para o concreto quando o abstrato se torna demasiadamente abstrato. Ainda abstrato, o termo instinto remete a nós algo que nós é mais familiar do que a genética, que pode ser comparado. Tal como o comportamento agressivo, o instinto pode ser comparado e visualizado a olho nu. Os genes não necessariamente. É claro que os genes são importantes, que não devemos jogar fora toda a pesquisa que os estuda, mas eu acho que também é importante analisarmos a partir desta perspectiva, diga-se, mais intermediária, entre a genética e o comportamento. Herdamos genes, mas também herdamos disposições ou pré-disposições comportamentais, em outras palavras, instintos e também, talvez, porque não, faz sentido, plasticidades. Pois é, temos instintos e plasticidades, e acho que a única ou derradeira plasticidade seja justamente a capacidade ''reflexiva', de re-avaliação do comportamento.
Por enquanto é isso, que bom!!
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