domingo, 16 de janeiro de 2022

Você é ou se considera uma pessoa altamente racional?

 Elaine Aron é uma psicóloga estadunidense e autora do termo "Pessoa Altamente Sensível", que se refere a um indivíduo dotado de alta sensibilidade de processamento sensorial, condição estimada para estar presente em até 20% da população, pelo menos nos EUA.


Inspirado nisso, resolvi, eu mesmo, cunhar um termo similar que, pra minha surpresa, parece que ainda não havia sido pensado, o de "Pessoa ou Indivíduo Altamente Racional", que é aquele que mais desenvolve suas capacidades intelectuais, no sentido de análise, julgamento e clareza de raciocínio; que se torna mais consistente no uso do pensamento lógico, priorizando por fatos/verdades, evidências ou aquilo que faz sentido do que crer em algo apenas porque promove o bem estar pessoal, aprendendo a estar sempre criticando suas próprias crenças e de atualizá-las. Esse indivíduo, portanto, apresenta grandes capacidades de análise e reflexão, de autoconhecimento e senso de justiça. 


Aqui, estou considerando como racionalidade a capacidade de pensar com lógica e não a de maximizar vantagens individuais ou coletivas, ainda que, por sua via, seja um resultado possível.


Correlações 


As pessoas altamente racionais são mais propensas a serem altamente sensíveis (consciência mais atenta ao mundo exterior), introvertidas (por causa da relação entre introversão e introspecção), autoconscientes, idealistas (percepção e resolução de problemas), superdotadas e filosoficamente maduras ou "hiperrealistas". No entanto, também existem correlações "negativas' à condição. São elas: uma maior dificuldade de socialização, irritabilidade, insensibilidade involuntária, antagonismo excessivo, super empatia, desajuste social e melancolia. 


A dificuldade de socialização, a irritabilidade e o antagonismo excessivo são reações lógicas à sua percepção de irracionalidade predominante nas sociedades, bem como na maioria dos seres humanos com os quais ele interage ao longo da vida.


A insensibilidade involuntária é causada pela própria tendência do altamente racional de priorizar dizer a verdade, objetiva (honestidade) e subjetiva (sinceridade), do que "mentir para agradar". Apesar disso, não significa que ele não seja empático, pelo contrário, porque graças à sua excelente capacidade de análise, síntese e memória de longo prazo, ele tende a desenvolver uma super empatia, de se colocar nas perspectivas de todos os que estão envolvidos dentro do contexto em destaque, ajudando-o a compreender a situação, até para que possa abordá-la da melhor maneira possível. Só que pode ter o efeito paradoxal e, até desagradável, de se expressar como um corretor impulsivo de contradições e falácias alheias, mesmo durante conversas triviais.


O desajuste social é um grande risco ao altamente racional, justamente por ser o mais propenso a se tornar profundamente consciente sobre o predomínio dos problemas causados pela irracionalidade humana, e isso também o tornar mais desanimado e cínico de se adaptar na sociedade, que pode chegar à  conclusão (realista?) de ser uma farsa ou mentira do que diz ser. Novamente, acontece esse choque entre o seu ideal racional e a realidade, geralmente muito aquém desse ideal. Pois os poucos países que podem ser considerados mais racionais, mas de maneira muito superficial, têm sido os escandinavos (já  o Brasil seria o oposto). 

 

A melancolia é uma reação comum ou esperada do altamente racional por causa do seu profundo realismo, sobretudo em relação à vida.


A dificuldade de socialização, em partes, é o resultado de sua natureza mais introvertida ou introspectiva e, também, seletiva. Se, a priori, gostar de estar sozinho, com os próprios pensamentos, não é intrinsecamente ruim. O problema é quando esse desejo resulta em um isolamento progressivo do convívio alheio.


Irritabilidade, insensibilidade involuntária, antagonismo excessivo e super empatia, reações comuns que tendem a afastar os outros do convívio com o altamente racional, podem ser controladas. Inclusive, o seu grande poder de análise pode ajudá-lo a rever suas condutas e melhorar, por exemplo, evitando ser sempre franco e a querer "ensinar" os outros o que considera certo, e que tende a ser mesmo o mais certo ou ideal. 


Quanto à melancolia, se é impossível deixar de senti-la a partir da verdadeira maturidade filosófica, de consciência sobre a finitude, a fragilidade e a igualdade da vida, sobre quem realmente somos e o que realmente importa, pelo menos é possível administrá-la e com a própria racionalidade, por exemplo, também buscando pelo lado doce da vida, para equilibrar. 


Cultural ou ideologicamente falando, as pessoas altamente racionais são muito prováveis de serem:


- Progressistas (mais para a social-democracia), mas nunca rigidamente ideológicas, pois sempre buscam considerar os pontos mais adequados (ou racionais), independente do grupo que os defende; 


-- Particularmente críticas ao sistema capitalista, bem como à qualquer outra ideologia que também apresenta contradições morais, falácias e/ou que se baseia em crenças infundadas;


-- Ateus ou agnósticos (se as crenças religiosas são exemplos clássicos de irracionalidade);


- A favor da preservação do meio ambiente;


- Do respeito aos direitos humanos: individuais, das mulheres, de minorias e aos animais (pode ser que muitos altamente racionais se tornem veganos/vegetarianos ou reducionistas éticos);


-- Enfim, contra preconceitos, especialmente os irracionais ou sem justa causa...


São quantos?


Ao contrário dos altamente sensíveis, eu acredito que a proporção de seres humanos que são altamente racionais seja bem mais baixo do que essa média de 20%, que tem sido estipulada para o primeiro grupo, se eu pensei nesse termo para me referir aos mais racionais de todos, portanto, possivelmente uma pequena minoria.


É uma condição geneticamente determinada??


Se todas as nossas características cognitivas e psicológicas apresentam carga genética ou biológica, então, o mesmo para a capacidade racional e os seus níveis mais altos. Claro que ter um potencial não significa que se irá alcançá-lo, ainda que, por ser um nível muito expressivo, a elevada racionalidade pode ser o destino para quem parece ter nascido com seu potencial.  


É um tipo de personalidade??


Não necessariamente, por ser um conjunto de habilidades (analítica, reflexiva, de autoconhecimento...) que tem como principal finalidade promover a compreensão sobre qualquer tópico, especialmente dos mais importantes, ainda que alguns tipos de personalidade sejam muito mais comuns do que outros nesta população.


Como se avalia o nível mais alto de racionalidade?


Se, por esse conceito conciso que tenho usado, todo aquele que apresenta ou que acumula um grande predomínio de crenças sustentadas por fatos, evidências ou padrões lógicos, e que esteja sempre usando suas capacidades analíticas e de julgamento, inclusive sobre si mesmo, ao invés de confiar cegamente em sua intuição, é provável de ser uma pessoa ou indivíduo altamente racional.


Estereótipos 


O altamente racional é o mais adaptado 


A racionalidade, assim como a inteligência emocional, é uma característica muito positiva que ajuda o ser humano a compreender e a lidar com a realidade da melhor maneira possível. Apesar disso, a alta capacidade racional pode ou tende a aumentar o seu nível de desajuste nas sociedades humanas, até mesmo por causa da irracionalidade predominante nas mesmas, desde os primórdios da civilização. Como resultado, tal como acontece para a inteligência emocional, a racionalidade parece que é mais adaptativa em níveis moderados.


Ele é um excelente planejador  


Não são todos os indivíduos altamente racionais que são excelentes planejadores, primeiro porque o conceito de racionalidade é a capacidade, tanto cognitiva quanto psicológica, de priorizar e lidar com a verdade objetiva, não necessariamente de organização pessoal. Isso significa que, indivíduos que não são altamente irracionais, inclusive os que são o oposto, também podem ser muito organizados. Segundo que, a capacidade de se organizar também está relacionada com o nível de adaptação social do indivíduo, que depende de vários fatores, muitos que estão além do seu próprio controle. 


Ele é superdotado


Não são todas as pessoas altamente racionais que são "superdotadas", mesmo que a alta capacidade racional possa ser considerada uma forma de superdotação e que exista uma provável correlação positiva com ser academicamente inteligente. Porque a racionalidade é uma característica qualitativa e não quantitativa da inteligência humana, que é mais sobre constância de acertos; de precisão factual, de julgamento e acúmulo de crenças ou opiniões baseadas em fatos, do que de conhecimentos técnicos. 


Ele não é emotivo


É verdade que, sem compreensão e controle das próprias emoções, é bem provável que nos tornemos mais preconceituosos e/ou fanáticos. Mas por serem nossos canais de reação e julgamento subjetivo a contextos, indivíduos, ideias e pensamentos, elas têm grande importância para a racionalidade, especialmente quando são acessadas de maneira adequada. Portanto, não é a falta de emoção ou a insensibilidade que nos faz mais racionais, mas o seu uso mais coerente. 


Eles é mais calmo ou equilibrado


O mesmo erro, de considerar a racionalidade um tipo ou traço de personalidade, é cometido em relação ao estereótipo de que os indivíduos altamente racionais são mais calmos ou equilibrados. Pois, como fervorosos defensores da verdade e, portanto, da justiça, faz sentido que acabem se tornando mais reativos, especialmente a partir dos constantes confrontos com aqueles que se apegam à ilusão; que defendem mentiras perigosas que podem ou prejudicam outros indivíduos (humanos e não-humanos);que sempre se comportam de maneira irracional. Eles ainda podem ser mais calmos do que a média, mas não que sejam completamente indiferentes ao que acontece ao seu redor e no mundo.


Ele é o mais pacífico 


Em sociedades dominadas por uma maioria de indivíduos psicopáticos e, portanto, baseada em parasitismo social e/ou opressão ideológica, não há razão racional para baixar a guarda e se tornar absolutamente pacífico, porque também pode significar que se está conforme ao que acontece de errado ou... irracional.


Perceba que, para o mais racional, o contexto é muito importante.


Ele não pode ter transtornos mentais


Pois, uma grande sensibilidade, cognitiva e emotiva, em interação com ambientes sociais hostis pode ou tende a resultar em efeitos psicossomáticos, como a timidez, por exemplo. Se qualquer grande sensibilidade que apresentamos está relacionada com um maior risco de desenvolver algum tipo de transtorno. No mais, o altamente racional é o mais intelectualmente saudável, não o mais mentalmente. Também parece lógico que o mais racional tende a lidar melhor, mesmo numa situação pessoal de desenvolver um transtorno, por causa de sua própria racionalidade, com o constante auxílio da inteligência emocional.  


Quanto aos altamente irracionais 


Os indivíduos mais irracionais são fortemente propensos a confiar em suas próprias intuições de maneira indiscriminada, provavelmente por também apresentarem déficit em autoconhecimento. Como resultado, estão em grande risco de construir mapas mais caricatos da realidade e se comportar de maneira irracional.


Eles são muito mais comuns que os altamente racionais, inclusive, boa parte das estruturas ideológicas e culturais humanas estão constituídas por ideologias predominantemente irracionais, que têm a mentira ou o engano como matéria prima... 

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