terça-feira, 31 de março de 2020

Precisão semântica e a confusão entre estética e pragmatismo conceitual

Precisão semântica e a confusão entre estética e pragmatismo conceitual

Verdade é o mesmo que conhecimento??

Sabedoria é o mesmo que racionalidade ou que razão??

Pois eu sou da opinião, e que não é apenas uma opinião intuitiva, de que sim, verdade e conhecimento são praticamente a mesma coisa, assim como sabedoria, racionalidade e razão. Mas, então, por que tantas palavras conceitualmente próximas??

Ora, por "mera' questão estética. Mais palavras, mesmo se forem extremamente parecidas em seus conceitos, menos repetitivo e enjoado ficam os textos que escrevemos.

Além do excesso de sinônimos, um problema consequente é a confusão entre estética e pragmatismo conceitual. A existência de palavras como alegria e felicidade, serve para dar mais beleza aos textos, mas não devemos perder muito tempo tentando procurar ou inventar diferenças entre elas, já que têm praticamente o mesmo significado. Geralmente são palavras com origens etimológicas e culturais distintas, adotadas por uma mesma língua. O ideal/correto é sabermos que são usadas justamente por razões estéticas. Essa situação é mais complicada quando os sinônimos são sobre significados essenciais para a nossa compreensão de mundo, tal como os exemplos que explicarei embaixo.

Explicando verdade/conhecimento e sabedoria//razão/racionalidade

A verdade tem sido definida como um fato determinado, por exemplo, "É verdade que eu não sou tão alto quanto você". Ou como uma interpretação subjetiva "A minha verdade não é melhor que a sua". Já o conhecimento tem sido definido como uma verdade construída a partir de fatos determinados, por exemplo, "O conhecimento da geografia se refere à interação do homem com a natureza". Mas, se pararmos para pensar, todo conhecimento é verdadeiro e toda verdade é conhecimento, no sentido de "conhecer", de "saber". Ao buscar pela essência conceitual da verdade, acabei por encontrar um contraste dela, mas com a realidade. A verdade como uma reflexão da realidade a partir da perspectiva de um ser vivo. E a realidade como sinônimo da própria existência, independente se a percebemos ou não. Por isso que penso ser mais eficiente pararmos de tratá-los como se fossem conceitos absolutamente diferenciados.

O mesmo para as outras três. Se ser racional, dotado de razão ou sábio é praticamente a mesma qualidade. O problema são as atribuições indevidas. Se sabedoria é a busca pelo conhecimento, muitos a definem restritamente como "bondade", e ainda do tipo "fazer o bem, sem olhar a quem", isto é, de praticar o altruísmo sem ter conhecimento para quem o está praticando... contraditório, se a sabedoria é sempre sobre buscar pela verdade.

Se racionalidade é a capacidade de pensar reflexivamente.. em busca do conhecimento, muitos a definem como frieza analítica, criando uma dicotomia absoluta e falaciosa entre sentimento e fato, como se os sentimentos não expressassem verdades, diga-se, mais subjetivas. Mesmo se a sabedoria é definida como bondade incondicional, ou a racionalidade como frieza analítica, todos concordam que o sábio e que o racional sempre buscam pela verdade.. ou conhecimento.  A diferença é que o altruísta pensa que a verdade só pode ser encontrada pela sensibilidade de seus bons sentimentos, enquanto que o egoísta vai pelo caminho oposto, em que a frieza na análise levaria ao saber purificado de atribuições subjetivas, supostamente condenando-as (na verdade não o faz porque sobrepõe sua natureza egoísta sobre sua percepção de mundo). O primeiro aborda a realidade apenas pela análise moral, em primeira pessoa, em que é inevitável a empatia de se colocar no lugar do outro, e o segundo apenas pela análise factual, distante e também secretamente hipócrita (blefe do relativista moral). Ambos incompletos e, portanto, equivocados. No mais, pela compreensão dos conhecimentos ou verdades existenciais (que são os mais importantes), o altruísmo se torna definitivamente preferível ainda que, continuando ser necessário saber "para quem".

Política do Amor Perfeito

Política do Amor Perfeito

Pela tática política do "dividir para conquistar", o povo é enfraquecido por cisões internas plantadas por minorias inescrupulosas e organizadas para, então, ''governa-lo''. Cruamente falando, assim tem sido a desgovernança humana em sociedades complexas desde há muito tempo.

Agora, por minha teoria simples de dominação social, uma elite (de preferência, filosófica), ao invés de dividir/enganar para explorar o povo, lhe faz apenas o bem, tal como em uma sociedade ideal. A partir daí terá como resultado o seu total controle, afinal, não haverão mais razões para revoltas ou convulsões sociais. Eu chamo esse novo, porém, óbvio jeito de fazer política de "Amor Perfeito", em que, pela aplicação integral da sabedoria, o governo será excepcionalmente benevolente e sagaz, preocupado primeiramente com o bem estar e com a evolução da humanidade e  também com sua interação harmoniosa com o meio natural.

Democracismo

É a crença exagerada na funcionalidade plena e natural de uma democracia absoluta. É parecido com a crença no livre mercado porque também se baseia na ideia de autonomia total só que do povo em relação às elites, enquanto que no liberalismo econômico é a do mercado em relação ao Estado. Se o Estado não está funcionando corretamente, liberais da economia prescrevem ''elimina-lo'' ou reduzi-lo ao nível mínimo de intervenção sobre o empresariado e suas travessuras. No democracismo, são as elites as eliminadas, pois se pensa que o povo [ou que qualquer nível de povo] é plenamente capaz de autogoverno. Para o liberalismo econômico, acredita-se que um organismo vertebrado, como a sociedade complexa, pode se tornar invertebrado, sem ir se desmontando no processo. O estado aqui tendo como equivalente metafórico o esqueleto. Para o democracismo, crê-se, sem ter essa dimensão explícita e didática, que o organismo ou corpo social complexo possa existir sem sua cabeça ou elites. Ainda que receite por uma democracia mais participativa [plebiscitos], sem uma classe política que representa apenas os seus interesses, também [sempre] prescrevo moderação e que, neste caso, se consiste na preservação e no melhoramento significativo das elites, de oportunistas parasitários para verdadeiros governantes, que amam ''o povo'' como a si mesmos. Pelo democracismo, tomam-se opiniões ou posicionamentos da maioria como sacramentados e, consequentemente, despreza-se que, dentro de uma diversidade de perspectivas, algumas estão mais certas que outras, independente se a maioria concorda ou não, porque são mais factuais, baseadas na capacidade de atender com honestidade ou precisão a critérios estabelecidos [ex.: qual é a melhor maneira de combater as desigualdades sociais severas? uma das vias mais seguras para conseguir atender a esse critério é a distribuição igualitária de renda]. Outro problema é de se pensar que, com uma democracia participativa, todas as pautas poderão ser colocadas em plebiscito. Por exemplo, a união homo-afetiva. Não faz sentido que algo tão íntimo e tão racionalmente desejável [que adultos possam se unir oficialmente, independente de suas orientações e identidades sexuais] tenha que passar pela aceitação pública. Pois é, não tem! O democracismo padece do mesmo mal que acomete à boa parte das ideologias, se não sua característica principal/e/involuntária, o extremismo, já que, por sua crença, automaticamente todas as questões se tornam conclusiva e igualmente julgáveis pela opinião pública. Na verdade, é possível concluir que qualquer uma dessas questões pode muito bem ser corretamente julgada sem a necessidade que seja em conjunto ou por uma maioria, desde que o indivíduo ou um grupo menor de indivíduos estejam seguramente embebidos de racionalidade.

Mas, então, por que a democracia participativa é desejável?

Um ''pouco café com leite'', mas nem tanto...

Lembra de quando você brincava com seus irmãos e primos e tinha o mais novinho, ainda na primeira infância, que os adultos forçavam a participar das brincadeiras?? Eu aposto que você também se referia a ele como ''café com leite'', porque ele brincava mas não necessariamente de maneira efetiva. Pois é mais ou menos isso que uma democracia participativa e, pasmem, também aristocrática, por seu conceito mais ponderadamente tomado, se consistiria. Organismos complexos não existem sem um órgão hierarquicamente centralizado e especializado em seu controle, organização e decisão. O governo ideal, pela sabedoria, quebra os extremismos puristas das ideologias, isto é, suas imperfeições por distorção, ao harmonizar dois modelos primariamente antagônicos, o democrático e o aristocrático. A democracia representativa parte de premissa similar mas é evidente que o seu método de atração e constituição da classe política, de representantes do povo, é excepcionalmente falho, porque além de atrair os mais egoístas, que visam benefícios volumosos do cargo político, ainda dá poder total de decisão à população em momentos decisivos como nas eleições [diga-se, uma população em sua maioria mal informada, teimosa e chucra], isto é, um democracismo misturado à farsa desta representatividade.

[Ah, um governo ideal não coexiste com sociopatas, ok??... Algo que devo falar mais em outros textos.]

Portanto, a participação popular é muito importante para o funcionamento saudável do organismo social, por fazer justiça ao igualar o potencial de poder entre grupos e indivíduos, acabando com a falácia da dependência desigual, em que as elites se colocam como indispensáveis ao povo e, consequentemente, desprezando a indispensabilidade do mesmo. 

Mas, acreditar que o povo, em boa média, não é manipulável, plural em seus posicionamentos ou que a opinião da maioria deva prevalecer independente de sua qualidade, essa fé exagerada na ''sabedoria das massas'', é democracismo. 

segunda-feira, 30 de março de 2020

O conservador e o filósofo

Por ser um termo muito vago, conservador requer um conceito com base em sua expressão concreta e histórica. 

Curto, grosso e preciso [esqueci do pedante, mas ok]

Com base nos comportamentos mais comuns, praticamente característicos, daqueles que se denominam assim..

O conservador,portanto, é aquele que nega o cerne da filosofia, que é a verdadeira religião [e/que se principia pelo ateísmo], quer seja pela adoção de um sistema mitológico de crenças e/ou pela negação de outras verdades absolutas, como a igualdade essencial de todos os seres vivos. Nega a natureza ideal humana, fundamentada em autoconsciência, empatia, racionalidade ou ponderação, o máximo de inteligência/conhecimento que o ser humano pode atingir, o seu estado mais evoluído. 

Para o conservador, se o ser humano fosse uma ave, seria proibido de voar. Sendo um, quer que aja como um ''animal irracional'', para que possa continuar sendo o seu fazendeiro, o seu parasita, especialmente se este for o tipo mais abonado. Ele é incapaz de enfatizar pelo que temos de igual, de comum. Se pobre ou precarizado, age em conformidade à sua posição, apesar de nutrir a esperança de um dia subir de degrau na pirâmide da civilização típica. Assume a posição de "patrão" àqueles que se posicionam abaixo dele, incluindo a própria família. Age com base nos instintos que apenas tateiam cadeias alimentares, exatamente como um ser humano desprovido de boa parte daquilo que nos faz uma espécie única. Por isso que tenho o hábito, eu admito que, grosseiro, de apelidá-lo de ''elo perdido'' [quem dera se ''perdido'']. 

O filósofo é o oposto do conservador, por ser um conceito bem definido e, também, por basear-se na busca pela sabedoria, isto é, por todos os conhecimentos ou verdades, de nunca negar fatos, morais/existenciais ou concretos. O conservador nega fatos ou verdades que negam sua subjetividade ou perspectiva, predominantemente egoísta ao invés de altruísta, utilitária ao invés de contemplativa, competitiva ao invés de solidária, concreta ao invés de abstrata, artificial ao invés de real, autoritária ao invés de reflexiva, medíocre ao invés de ideal, organizada ao invés de harmônica.

Pela filosofia, o egoísta, o utilitário, o concreto, o artificial, o autoritário, o medíocre e o organizado, terão todos os seus respectivos lugares. Mas, sempre em harmonia com os seus pólos opostos. Mesmo uma virtude incontestável, em sua concepção primária, quando em desequilíbrio, resulta em consequências aquém do desejável. O altruísmo, por exemplo, que, em excesso, se expressa como um sacrifício suicida. Arriscar a própria vida é,  algumas vezes, necessário ou imprescindível (o limite moral). Outras vezes, é muito mais um atributo de impulso sentimental do que por reflexão ou conhecimento de causa. O altruísta sem conhecimento é uma presa em potencial. O conservadorismo é um extremismo historicamente naturalizado. Não representa um corpo social saudável, harmônico, simétrico... 

A suposta metafísica do conceito de conservador

'Filósofos" conservadores gostam de tecer definições extremamente puristas e idealistas sobre o termo conservador. Existem virtudes praticamente unânimes  entre eles, pensadas para defini-lo, que, na verdade, esboçam mais aquilo que pensam sobre si mesmos. De que o "verdadeiro" conservador é o mais cético, cauteloso, cuidadoso, racional e honesto de todos... 

E ainda tem aqueles que chegam ao cúmulo da idealização denominando o conservador como uma pessoa que só quer o bem ou preservar "coisas boas" [se, com base em concepções subjetivas ou racionais/mais ideais].

Ok...

O falecido "filósofo' Roger Scruton foi um dos que participaram deste concurso para ver quem idealizava mais o conservadorismo.

Mas, na realidade prática, em termos de identidade, o que vemos é outra coisa. Talvez, esse conservador quase metafísico exista, mas é  minoria no meio de uma multidão de cidadãos de bem tipicamente hipócritas, nem um pouco céticos e/ou parcamente racionais. Pra começar, o exemplo do abraço instintivo de muitos deles às crenças mitológicas ''reconfortantes'. É certo que a maioria desses cidadãos se consideram como personificações das virtudes conservadoras... 

A comparação com o termo filósofo é válida, porque algo parecido mas, não-idêntico, acontece com ele, se também existe uma maioria de indivíduos, muito aquém do título, se definindo como tal.

É verdade que o termo filósofo é bem definido, mas, ainda é preciso buscar pela definição para sabedoria e verdades, para ampliar e reforçar sua estabilidade ou segurança semântica. A imprecisão histórica de ambos os termos que explicam o que é ser filósofo, tem sido uma das razões para a sua prática diversamente ideal do desejável. Autoconhecimento fraco é outra causa, mais intrínseca, que explica a auto-identificação assimétrica. Por isso que tem casos em que é possível/o resgate de conceitos e práticas ideais apesar da prática histórica e descaracterização conceitual massificada, enquanto que, para outros, por serem tão vagos, não é possível o mesmo processo e ser bem sucedido, sem que replique o "problema" da/expectativa/de/uma definição precisa, no sentido de restrita, a partir de um vocábulo intrinsecamente vago. 

Como conclusão, o suposto conceito do ''conservador ideal'' cabe perfeitamente ao filósofo. Não basta a autodefinição ou auto-identificação. Também é fundamental demonstrar que não se consiste apenas em um desejo de pertencer à certa identidade, que seria mais narcisista do que intelectualmente honesto/ objetivo. 

sábado, 28 de março de 2020

Ateísmo, essência conceitual e dois grupos predominantes de ateus

O ateísmo é a descrença em divindades. Basicamente isso. De resto, nada impede que um ateu seja: sociopata, egoísta, imprudente ou um altruísta patológico. Também não impede de acreditar em deuses terrenos, em mitos de carne e osso e/ou a seguirem cartilhas ideológicas rígidas, sem qualquer pensamento crítico. Está aí a razão de me identificar como ateu mas de não me identificar com a maioria dos ateus, porque se dividem em dois grupos predominantes: imorais e ideólogos (este segundo que me parece o mais comum). O primeiro justifica seu ateísmo para agir imoralmente. Parece que a maioria daqueles que relativizam a moralidade, chamando-a de ilusão ou desconhecendo-a, são de ateus, desse tipo. O outro grupo não acredita em deuses metafísicos mas são tão vulneráveis a fanatismos e preconceitos quanto o resto da população, incluindo o tipo imoral de ateu, resultando em seu abraço a "mitos" humanos e/ou seguindo ideologias, tal como se fossem seitas ou mesmo "religiões", mais pela crença do que pelo conhecimento. O ateísmo sozinho é apenas ateísmo, não transforma ninguém em sábio por isso, mas, todo sábio precisa aceitar os conhecimentos existenciais e inevitavelmente o ateísmo. 

Ideologia versus sabedoria, uma metáfora e uma contextualização [projeto de militarização das escolas]


Ideologia versus sabedoria

A metáfora do cobertor

Está uma noite fria e você se prepara para dormir. Pega um cobertor qualquer, se cobre, mas percebe que os pés ficaram pra fora. Puxa pra baixo, e então, desprotege o pescoço e os ombros. O cobertor é curto demais para o seu corpo. Acontece... 

Eu não sei quanto a vocês, mas eu tenho a impressão que toda ideologia se parece com um cobertor curto cobrindo um corpo maior.. Se não tira de um lado, irá tirar de outro. Em cada ênfase numa coisa, extrapola ou falta n'outra. Querem ver pra crer??

O estoicismo, comum a tantas ideologias conservadoras [dos elos perdidos, oops]. 

O hedonismo, comum a tantas ideologias progressistas.. 

O pacifismo, que exagera a dose em sua ênfase pela paz. A ''doutrina espartana'', que vai pelo caminho oposto, exagerando sua paixão pela guerra.

É o ateísmo típico, que despreza a verdadeira religião [que se consiste no âmago da filosofia] e acaba promovendo o niilismo.

Ou então é a crença mitológica, que coloca sua fantasia ou ''necessidade de acreditar para viver'' muito à frente da sanidade mental. 

Também podemos perceber esses desequilíbrios nas culturas nacionais.

A cultura japonesa, que exagera na disciplina, obediência e ordem;
A cultura brasileira, em que a ''zoeira never ends'';
A cultura americana, em que dinheiro e ''ser um winner'' é tudo e mais um pouco;
A cultura francesa, que exagera em sua apreciação estética, caindo na ilusão de usá-la como esnobismo frívolo. E assim por diante... 

Todas as ideologias têm em comum se definirem como as únicas capazes de revelar a verdade [absoluta] ou o modo mais ideal de existir. Mas, estão todas essencialmente erradas, pois sempre acabam exagerando no ponto.

A ideologia é a significação ou justificativa da cultura, do porquê de se constituir deste ou daquele jeito. A cultura, por sua, vez, é a organização ritualística e simbólica ou, pela linguagem/artes, da adaptação ou, do vínculo de sobrevivência do ser humano ao seu ambiente. 

Portanto, mesmo que não seja sua intenção original, a ideologia sempre acaba enfatizando mais um lado do que o outro [ o seu oposto], e, com isso, deixando os pés ou o pescoço desprotegidos. 

A sabedoria, por essa metáfora,  é o cobertor que cobre todo o corpo... de conhecimentos, especialmente os mais básicos [os mais importantes], e ainda sobrando... É o fim de todas essas falsas dicotomias.
 
Do pacífico também saber se defender,
Do estoicista também saber curtir a vida...

Enfim, de todos eles deixando de serem pacifistas, estoicistas... e se tornando sábios ou racionais..

Esses conflitos ideológicos tem como causa principal justamente o atrito entre os níveis de consciência hiper-realista em relação aos níveis surrealista e realista. 

Quem sabe que a vida é uma só, geralmente, quer viver a sua, da maneira mais confortável e prazerosa possível...

Quem acredita que viverá pra sempre no além, é mais propenso a ter uma vida de obediência e abnegação.

Quem só se preocupa com a própria vida, e portanto, despreza a igualdade universal que une a todos, é muito mais provável que aja de maneira egoísta ou cruel.

Juntar o útil ao agradável, o necessário ao verdadeiro, esta que é a principal função da sabedoria, enquanto que as ideologias tendem a separar os dois, por muitas formas ou distorções. 

O que as ideologias dividem, a sabedoria une.

As ideologias são como as projeções cartográficas de Peters e de Mercators, ambas versões distorcidas do mapa-múndi. E a sabedoria, por sua vez, é  como as dimensões precisamente corretas do nosso planeta, as verdades, e nada mais que todas as verdades, especialmente as mais básicas/existenciais.
 
Contextualizando para as escolas públicas brasileiras...

Um outro exemplo, bem atual e até potencialmente problemático, é a sanha do desgoverno bananeiro, neste ano desastroso e triste de 2019 DC, com o seu projeto de militarização das escolas.
 
Como não haveria de ser diferente, eu discordo com veemência desse atropelo. Mas, concordo que as escolas públicas do ''nostro'' país estão bem avacalhadas, com muito indisciplina, professores quase reféns dos alunos... Concordo que, décadas atrás, os estudantes tinham mais respeito pelos professores..
 
Duas ideologias disputam a hegemonia, isto é, dois extremismos. A ideologia "espartana", militarista, e a "ateniense", mais progressista. Em ambas, excessos são enfatizados, e que seriam complementares se estivessem em cooperação.

Hoje, o estudante, o jovem, não é mais ''propriedade de deus e da pátria'', sem mais sofrer a uniformização de sua personalidade e apanhar de palmatória.  Por outro lado, o que funcionava no ambiente escolar daqueles tempos, também foi cortado pra fora pela pedagogia progressista, que estimula o diálogo e o respeito entre professores e estudantes. Ideologias progressistas são sempre idealistas, mas, frequentemente, tratam as ideologias anteriores à elas [conservadoras], com extremo desdém, como se tivessem feito tudo errado..

Né bem assim não, bem!!

É perfeitamente possível impor certa disciplina, com direito a níveis variados de castigos, correspondentes,  sem sacrificar as conquistas progressistas que favorecem o estudante, o jovem, mas que têm sacrificado os professores.

sexta-feira, 27 de março de 2020

Diversidade e hierarquia de verdades


Diversidade e hierarquia de verdades

Verdade: é a reflexão da ou de certa realidade pela perspectiva de um indivíduo. Realidade: aquilo que existe. Verdade: aquilo que é percebido e/ou descrito da realidade. Verdade é praticamente sinônimo de realidade por ser seu eco, de fora para dentro de uma subjetividade, e até pode ser compreendida como um conceito que amplifica o que é real.

A priori, toda verdade é subjetiva porque só pode existir a partir da consciência e/ou percepção de um indivíduo ou ser vivo. No entanto, como é percebida ou sua natureza, faz com que ocorra uma diversificação de tipos que procurarei explicar aqui, de acordo com o meu entendimento, e buscando fazê-lo com base no máximo de precisão factual ou neutralidade ideológica.

Verdades subjetivas: são as nossas reações ou sensações que são verdadeiras e, portanto, verdades ou fatos derivados da interação indivíduo x meio. Por exemplo, se eu sinto frio, então, é uma verdade subjetiva porque minha sensação de frio é verdadeira. Também podem ser definidas como verdades abstratas/derivadas, por se referirem a comportamentos ou reações, por interação.

Verdades universais ou realidades: são fatos ou existências que podemos perceber justamente pela neutralização das nossas atribuições qualitativas, isto é, definindo o objeto sem distorção de perspectiva. Por exemplo, a existência de uma pedra. Se eu só conseguisse tocar na pedra, se não pudesse enxerga-la, então, minha sensação de toque à ela, meu reconhecimento de sua existência por esse canal ou sentido, seria uma verdade universal, talvez incompletamente percebida.. de sua natureza física sendo reconhecida por minha mente. A existência da pedra, independe da minha consciência qualitativa ou reativa à ela e, portanto, é uma verdade universal, quando percebo sua natureza e não a minha projetada nela.

Se eu sou percebido pelos outros com base em minha natureza, preferencialmente, pelo meu ''todo'', então essa percepção é uma verdade universal. O que os outros percebem de mim com base em suas atribuições reativas, são verdades subjetivas.
 O que as difere é o grau de precisão dos critérios de identificação e categorização. Mais objetivo, mais universal.
 
Verdade x realidade

Se eu tenho a pele branca, então isso é uma realidade, um fato. Isso ainda não é uma verdade universal porque depende do nível de acurácia visual quanto a esse meu atributo. Porque a espécie humana apresenta, em sua maioria, uma excelente capacidade visual, então, a cor da minha pele é facilmente concebida para quem enxerga como uma verdade universal, que é quando minha natureza é percebida por todos os indivíduos capazes de enxergar, de acordo com a naturalidade visual de ''nossa'' espécie. A pele humana, por esse sentido, também é uma verdade universal.

Verdades pragmáticas: são condições lógicas e/ou verdadeiras para comportamentos ou fenômenos (cadeias de comportamentos).  Contrastante às subjetivas, as pragmáticas são menos no sentido reativo-emotivo/sensorial e mais no responsivo-cognitivo. Por exemplo: eu sinto frio (verdade subjetiva). Se eu sinto frio, então eu preciso me esquentar para não ficar com hipotermia (verdade pragmática.. ou lógico-primária). A subjetiva é primariamente reativa. A pragmática é uma reação ou resposta cognitiva à reação subjetiva do corpo. Mas, também em relação às facetas universais de fatos ou verdades universais que podem ser capturadas, isto é, pode se expressar a partir da subjetividade de um indivíduo ou ser descrita como resposta lógica de uma verdade universal. Exemplo: ''se eu estou sendo ameaçado, então, eu preciso me proteger''. Resposta pragmática/verdadeira a uma sensação ou verdade subjetiva [o medo]. E por uma perspectiva impessoal ''A Polônia reagiu à invasão da Alemanha, na segunda guerra mundial''. Interações coletivas e historicamente datadas sendo reconhecidas por um indivíduo.  Podemos concluir que as verdades pragmáticas são basicamente lógicas, não necessariamente racionais.

Verdade essencial: é a essência ou o cerne das realidades particulares. São origens e universais. Alguns exemplos que já usei em outros textos: a verdade essencial das guerras humanas é a disputa territorial ou de poder entre machos da espécie. A verdade subjetiva é a sensação do indivíduo direcionada para certo objeto de análise ou interação mental e intelectual. Ela é uma verdade porque a sensação subjetiva existe. Mas isso não significa que não seja predominantemente limitada ou diluída de veracidade, especialmente a partir do momento que busca se passar como essencial. É o caso do soldado ou do militar que define a causa para as guerras humanas como uma ação plenamente racional a partir de sua percepção conclusivamente subjetiva.  Verdades essenciais são os verdadeiros porquês. As subjetivas são os nossos porquês baseados no que estamos sentindo. As universais são tudo aquilo que existe, e que percebemos por suas próprias naturezas. As pragmáticas são condições, regras ou objetivos verdadeiros, que contêm mecanismos lógicos.

No caso da guerra
Subjetiva: o que eu sinto sobre ela [verdade sensitiva]
''Eu sinto que a guerra é ruim''

Universal: o que é a guerra [verdade descritiva]
''A guerra é um evento conflituoso em que grupos antagônicos duelam uns contra os outros a partir de ofensivas estratégicas buscando a defesa  ou o avanço em território alheio''

Pragmática: os mecanismos que resultam na guerra e os que são usados durante a mesma..
''Se o meu território é invadido, então eu posso declarar guerra ao invasor. Eu posso invadir aquele território se eu almejo suas riquezas naturais''
''Se um povo x é ameaçado, ele pode reagir de maneira y que pode resultar em conflito armado''.

Essencial: o derradeiro porquê das guerras
''Disputa territorial de machos héteros''

Uma pedra

A minha reação à pedra é uma verdade subjetiva [''é uma pedra bonita'']
A minha percepção à sua natureza elementar é uma verdade universal
[''é uma pedra e não uma flor porque ela não é uma planta, porque é ...'']
Os mecanismos lógicos que a produziram e também os que mantém sua integridade física, são verdades pragmáticas [se a pedra tem nível de dureza x e recebe um impacto xx então é provável que irá se esfarelar ou ao menos se quebrar]
Sua origem, o porquê de existir e sua utilidade, são verdades essenciais
[a pedra se origina do solo, é um pedaço dele. Sua função elementar ou universal é sua própria autoexpressão e não tem uma função além disso, conhecida, por si mesma, individualmente falando].  

Verdade subjetiva: sensação verdadeira, de probabilidade de reação, de uma perspectiva de existência em contato com a realidade. ''O que eu sinto sobre o objeto''

Verdade universal: o objeto ou fenômeno percebido em sua integridade, sem ser uma atribuição reativa ou qualitativa ''Eu descrevo/reconheço o objeto com base em sua natureza''

Verdade pragmática: os mecanismos que resultam e que mantêm a integridade existencial de um objeto. ''Como eu respondo à primeira reação do meu corpo a partir de certa interação'' ou descrição impessoal.

Verdade essencial: a origem, o porquê ou a utilidade do objeto. ''O que consigo capturar de essencial de certo objeto''

Verdade existencial: esta verdade permeia todas as outras, a meu ver, uma categoria à parte, pois se refere à intimidade de existência do indivíduo, sobre sua vida, suas lembranças, suas tristezas, suas alegrias, suas esperanças ou expectativas, sua aceitação do destino final que o aguarda, seus métodos de como viver, aproveitar sua única vida e de que maneira também para com o outro. O amor é subjetivo mas também tem uma verdade existencial. A detecção sensorial da natureza de um objeto é uma verdade universal, mas a lembrança ou o valor que remete, também é existencial. A prática com base em verdades pragmáticas, por exemplo, a busca pelo prazer sexual a partir do ato que o gera. E a essência do que é ser existência. As verdades existenciais são as que constituem o nível mais alto de discernimento moral bem como sobre a realidade.  

Hierarquia de verdades, das mais universais às mais particulares

As primeiras verdades, a partir da perspectiva do indivíduo, são as subjetivas, porque expressam suas sensações em relação ao contato com o mundo. São também as mais particulares mesmo que nelas contenham tons óbvios de universalidade, por exemplo, a sensação de frio como resultado de um corpo sentindo a/sua temperatura cair. A variação de temperatura é uma realidade e uma verdade universal, porque independe de nossas sensações para existir e porque a grande maioria dos indivíduos, humanos e não-humanos, sentem variações ou variantes térmicas ou sua natureza elementar. Como que a sentimos é uma verdade subjetiva. Ela também é pragmática, porque apresenta padrões ou objetividade previsível.

Em segundo lugar, em termos de importância, a partir de  uma perspectiva individual, temos as verdades pragmáticas. As universais, as essenciais e as existenciais.

Níveis de consciência

Mais baixo o nível de consciência, mais predominante à percepção da consciência são as verdades subjetivas. Apesar de sua natureza comparativamente inferior às outras, as verdades subjetivas são básicas e, portanto, fundamentais, pois são um dos nossos primeiros canais de sensação do mundo. E, por serem produtos de processos adaptativos, são dominantes ao nível realista ou lógico-primário de consciência, ainda também com a necessária percepção de verdades universais.

A compreensão das diferentes partes de uma realidade que resultam nos tipos de verdade só é possível pelo raciocínio abstrato. Portanto, apenas o ser humano que pode alcançar à plena consciência ou espelhamento das demais verdades. No entanto, mais absoluta ou essencial for a verdade, mais difícil de ser detectada por conta própria e plenamente aceita como uma variante factual, pela maioria de ''nossa'' espécie.

A humanidade é caracteristicamente a quebra do monopólio da subjetividade sobre a percepção individual.

O  surrealismo, enquanto desvio do realismo no que condiz à básica função da inteligência, de espelhar realidades, isto é, construir verdades, resulta na distorção das mesmas, por exemplo, endereçando a uma verdade essencial, atribuições subjetivas. O surrealismo é a confusão entre o que é subjetivo e o que não é.

''1.Eu sinto nojo da barata. 2.A barata, portanto, é intrinsecamente nojenta'' - 1. verdade subjetiva, a sensação. 2. Atribuição equivocada.

''Eu acredito que exista 'um criador' do universo'' - verdade subjetiva.

O hiperrealismo, enquanto continuidade evolutiva do realismo, supera e desloca a percepção do indivíduo [humano] para as verdades mais importantes e, ao mesmo tempo, as que exigem mais raciocínio, que são as universais, as essenciais e as existenciais.


Verdades são conhecimentos

Se existe uma tendência de exacerbar diferenças entre sinônimos decididamente próximos, então, ao menos neste caso, ei de se buscar fazer o oposto. Conhecer ou reconhecer são verdades que são conhecimentos. Sim, o nível de precisão e a natureza da verdade, força o estabelecimento de uma hierarquia com base nesse básico critério.

domingo, 8 de março de 2020

O capitalismo é um autoritarismo líquido



O capitalismo é um autoritarismo líquido

O que é autoritário?

É o que é imposto sem ser dialogado, negociado, refletido ou pensado com todas as partes envolvidas. Essa é a essência conceitual do autoritarismo. (Geralmente, autoritários tendem a mentir sobre as suas reais intenções àqueles que almejam controlar e/ou explorar).

Hierarquias entre indivíduos e grupos, e nem mesmo a imposição, são intrinsecamente condenáveis. São as condições e suas consequências que são mais moralmente relevantes. Afinal, dentro de uma dinâmica social, é comum ou esperado que uns assumam a posição de comando e outros de subordinação.

Se as condições impositivas têm sérias consequências para certos grupos ou classes (de indivíduos) sem ter qualquer razão ou imprescindibilidade moral para isso, quer dizer, se existem alternativas que consigam atender aos critérios elementares, de adaptação e ordem social, sem resultar em injustiças, então, essas condições também são extremistas.

Agora, podemos pensar se essas definições são aplicáveis ao capitalismo bem como às suas derivações ideológicas, como o liberalismo e o neoliberalismo...

O capitalismo não é a favor do indivíduo

Um dos maiores mitos sobre o capitalismo é de que enfatiza o indivíduo sobre o coletivo, em oposição às ideologias oficialmente reconhecidas como autoritárias como o nazifascismo e o falso comunismo. No entanto, não são os direitos do indivíduo que estão em jogo no sistema capitalista e sim o lucro que ele, sozinho ou dentro de grupos e organizações, pode gerar e que vai, em boa parte, para mãos certas de uma minoria esperta. O indivíduo é exaltado como um meio e não como um fim em si mesmo. Não tem nada a ver com respeito à individualidade.

O capitalismo é um autoritarismo líquido, pragmaticamente adaptável a qualquer nível moral de sociedade, se numa ditadura nazista, onde empresários tiveram importante participação, ou em nossas democracias representativas, superficiais. Se o capitalismo fosse realmente a favor do indivíduo, combateria as desigualdades sociais, a inadequação e a exploração do trabalho que causa, bem como os preconceitos aos quais tem sido historicamente indiferente.