sexta-feira, 30 de outubro de 2015
A síndrome do polímata
Por que a maioria das pessoas inteligentes acreditam que podem opinar sobre tudo e especialmente em relação às ciências humanas??
Todo mundo pensa que é um erudito em comportamento humano.
Somos todos ''globalmente'' inteligentes??
A maioria das pessoas raramente pensam em estudar sobre física quântica (o blogueiro aqui incluído). Como resultado não se atreverão a opinar sobre este assunto. Em compensação, parece que temos alguns milhões de gênios em comportamento humano. Temos**
Tudo aquilo que observamos e deduzimos, com nossas mentes, estará parcialmente correto e errado. Em algumas perspectivas, estará ou poderá estar correto. Em outras perspectivas, é provável de não estar correto. No entanto, existem alguns poucos que não satisfeitos com suas conclusões iniciais ou com qualquer pobreza analítica de pensamento, decidirão continuar a tentar entender as ''coisas'', mesmo quando a maioria já tiver esgotado a sua curiosidade.
Ser pioneiro em qualquer questão ''relevante'', é quase um proxy para o gênio. O verdadeiro ''mente aberta'' que eu já mostrei em um texto anterior, aquele que tem bom senso e curiosidade /vontade/motivação para buscar pela ''verdade factual'', ou a perfeição perceptiva, será um destes fortes candidatos para a real e objetiva genialidade humana.
Em relação à física poucos se intrometem, mas nas humanidades e especialmente na psicologia, todo mundo quer opinar e pior, na maioria das vezes que não serão opiniões legítimas, mas repetições dogmáticas, isto é, do ''senso comum'' ou contextual, que está na moda ou então, achismos transformados em verdades absolutas. Além de não contribuírem para a melhoria do entendimento em relação a certos assuntos dentro da psicologia ou de qualquer outra ciência ''humana'', essas pessoas ainda irão ''vestir a camisa'' de estúpidos e aumentar a poluição ideológica que tanto afeta ''as humanidades''. Seria interessante se pudéssemos ter uma diversidade de observações e opiniões retidas diretamente das perspectivas existenciais de todas pessoas, mas o que temos, para mais da metade dos casos talvez, é apenas a expressão uníssona do treinamento cultural ou repetição ideológica do momento.
A síndrome do pseudo-polímata, além de se agravar em relação às ''ciências humanas'' (que diga-se, está povoada por este tipo que em épocas lombrosianas, eram denominados de matoides), por parecer mais fácil e mais pessoal ou subjetiva do que as ciências exatas, também será muito comum de acometer os tipos mais cognitivamente inteligentes. Mas as ciências humanas (qualquer ciência) também tendem a buscar pela exatidão, idealmente falando.
Para entender o comportamento humano, você precisa basicamente a priore de ter duas características cognitivas que são mutuamente complementares
- habilidades analíticas
- habilidades holísticas
Isto é, você precisa saber capturar o contexto e a imagem maior, os pontos de maior relevância (tópicos) de um determinado assunto, assim como também de ser bom para analisar detalhadamente o ''interior'' deste quebra-cabeças/contexto/imagem maior.
A maioria das pessoas, mesmo aquelas que são mais cognitivamente inteligentes, parecem não ser muito prodigiosas nas duas habilidades. Ainda vale ressaltar que o termo ''holístico'', em condições ideais de temperatura e pressão, deveria abarcar também os detalhes do contexto, justamente por querer indicar ''abrangência analítica''. O mesmo vale para o ''pensamento analítico'', que sem maiores reverberações contextuais, deveria/poderia indicar ou abarcar o adjetivo ''holístico''. Isto se consiste em um breve excesso de subdivisões semânticas, mas ao menos pra mim, não faz mal nem bem, só precisa ser mais especificado/explicado, como tudo aliás. Mas pelo que parece, não será impossível encontrarmos pessoas que são boas em uma dessas capacidades mentais e ruim na outra. O historiador que tem um conhecimento específico sobre uma determinada região da África, com requintes de detalhes, pode não ser bom para capturar a imagem maior, que nem sempre será o contexto, por exemplo, em relação ao porquê desta hipotética região ser mais pobre ou mais rica, mais violenta ou mais pacífica. E que neste caso está querendo indicar também a presença de fatores genéticos ou inatos. E é muito comum destes tipos em extrapolar seus conhecimentos específicos além de suas fronteiras lógicas, isto é, acreditar que a ''história africana'' possa explicar o comportamento, desprezando completamente os fatores genéticos.
O pensamento holístico é mais globalmente preciso enquanto que o pensamento analítico tenderá a ser mais especificamente preciso. Compreender a história e cultura de uma região é essencial para a história. Mas também seria importante ter conhecimento sobre comportamento humano, por meio da psicologia evolutiva, genética e/ou biologia. E este servirá como complemento final em relação a estes tipos de estudos. No entanto, a maioria das pessoas, novamente, não estarão plenamente conscientes desta necessidade.
Todo mundo tem um palpite sobre o comportamento humano, mas vejam só que não são apenas achismos, mas crenças factuais, isto é, de que estes achismos sejam fatos conclusivos, enquanto que continuarão a ser de impressões pessoais, retidas de observações unilaterais. O início do pensamento analítico/holístico sobre o comportamento humano, especialmente este tipo de pensamento, precisa de fato, começar por esta abordagem pessoal, que inevitavelmente desembocará em um cenário parcialmente tendencioso de interpretação. O ''truque'' será o de transcender os próprios preconceitos cognitivos ou basicamente ''ego'', em prol de um maior entendimento em relação à fenomenologia. A paradoxal e árdua tarefa essencial da humanidade é a de conseguir entender aquilo que acontece logo a frente do seu nariz. Pode parecer ridículo, mas quando você passa a desprezar todos os mitos universais antropocêntricos como aquele sobre a ''racionalidade humana'', então se tornará menos ''estranho'' constatar e aceitar/internalizar esta ''patética'' realidade.
Em outras palavras, dar menos importância a si mesmo e buscar pela neutralidade de julgamento, neutralidade que também não quer dizer ''niilismo subjetivo'', ''tudo é e não é'' e supostamente não se poder chegar a qualquer conclusão. Errado, por meio das múltiplas perspectivas, nós poderemos dizer de fato que tudo poderá ser e não ser, dependendo da perspectiva que estará sendo analisada.
As humanidades inflamam nossos egos, o contrário da frieza ''impessoal'' das ciências exatas, nas humanas, não estamos lidando com números, mas com pessoas e outras formas de vida terrestre. Estamos lidando com seres reais e mais, com você e eu, é uma abordagem pessoal. O que era pra ser, logicamente falando, o mais fácil de entender, é na verdade, o mais difícil, porque não estamos fazendo contas matemáticas para calcular a velocidade da luz ou o ângulo de um prédio de arquitetura moderna, estamos falando de nós (e de outras vidas). A inevitabilidade das ciências humanas é a de que, por agora, será pessoal em sua raiz.
Mais um mito humano: ''inteligente, logo eu posso opinar sobre tudo''
A ideia de que todas as pessoas que são mais cognitivamente inteligentes possam entender sobre qualquer assunto e especialmente aqueles que são mais logicamente fáceis de serem entendidos (e como eu tentei mostrar logo acima, não são) é mais um mito generalizador e pobre justamente nos detalhes e na imagem maior, que eu falei no início deste texto.
Por meio de recorrentes ecos dos dogmas igualitários de capacidade universal, isto é, todo mundo pode, por conta própria ou por meio de bons argumentos, concordar sobre um pressuposto que é irrevogavelmente racional, passamos a crer que a ''educação'' possa moldar mentes de maneira simples e direta. Se todos nós temos potencial para sermos racionais e empáticos, então bastará a educação. Novamente, o desprezo por detalhes e pela imagem maior.
A abordagem humana, em toda a sua multitude de composições individuais/inatas, em relação ao meio de vivência e observação, não será, em sua maior parte, direta/objetiva, profunda e construtiva/harmônica, em outras palavras, sábia.
Nossos olhos não vêem o mundo ao redor, mas aquilo que nossos cérebros filtram como ''real''. E o aparecimento e sofisticação das culturas humanas, mas sem uma igual evolução na sofisticação das mentes que estarão sendo expostas a elas, apenas aumenta a tendência humana de fuga da realidade.
Estamos muito preocupados com a realidade, porque não a conhecemos em toda a sua profundidade, mas também porque nossos cérebros foram moldados desde os primórdios de nossa espécie, para evitar um embate direto com a mesma. Geralmente, as pessoas muito realistas, tendem a se tornarem melancólicas. Eu sou uma delas.
Outro fator que complica ainda mais a capacidade humana de primar pela sabedoria, se dá por causa de nossas tendências egocêntricas. Isto é, nossas capacidades de expansão empática, tendem a se limitar aos nossos entes mais próximos bem como também a amigos.
Isso nos ajuda a explicar em parte o porquê de tantas pessoas (cognitivamente e intelectualmente) inteligentes, supostamente mais racionais, acreditarem cegamente em ideologias e partidos que são claramente contraditórios/mentirosos em relação aos seus pressupostos políticos, aquilo que falam, daquilo que fazem (inclusive em suas vidas privadas).
Sim, isso mesmo, como eu já mostrei no antigo blogue, para podermos analisar todo um bojo de situações dentro de um determinado contexto, nós também precisaremos de uma abordagem empática e pensarmos nos outros, suas inter-relações e não apenas em nós.
A autoconfiança, exagerada em muitas mentes mais habilidosas, não terá apenas o efeito de torná-los megalomaníacos em relação às suas crenças de precisão cognitiva/intelectual, mas também os fará arrogantes e muitas vezes irredutíveis quanto a mudar de ideia ou tentar melhorar suas crenças. Aquilo que é um defeito comum entre todas as classes cognitivas ''normais'', poderá estar amplificado entre as ''elites cognitivas'', e parece fazer muito sentido quando aplicamos esta máxima no mundo real.
Seres que estão em constante processo de auto-aperfeiçoamento e isso não quer indicar melhoramento classicamente narcisista, mas em termos de comportamento e entendimento do mundo, ''mesmo'' sem serem polímatas, ainda serão globalmente inteligentes, ou sábios, seja para dissertar brilhantemente sobre aquilo que sabem muito, até o de recuar humildemente em relação àquilo que não apresentam disposição cognitiva recíproca e expansiva.
Portanto, as ciências humanas precisam da mesma exatidão/precisão que as ciências exatas, se não para tudo aquilo de que faz parte ou representa, ao menos em relação aos tópicos mais importantes, especialmente o ser, o espaço/tempo em que vive e suas respectivas considerações/enfatizações.
Mesmo os mais brilhantes dos polímatas ainda não serão conhecedores absolutos de tudo aquilo que pode ser descoberto ou produzido.
Sábios e gênios que serão os mais prováveis ao menos de se aproximar desta tentativa/busca, o que não significa que conseguirão alcançar esta finalidade espetacular, ter todo o conhecimento deste mundo.
E como conclusão final, as ciências humanas parecem ser muito mais fáceis do que as ciências exatas, e talvez sejam mesmo em relação a muitos aspectos cognitivos importantes. Mas justamente pelo fato de haver o fator ''ego humano'' que não está sendo nenhum fácil para boa parte da humanidade em entender a realidade.
O mito da racionalidade universal humana em conluio com a ideia de que todos apresentarão um potencial similar para o engajamento ideacional e comportamento racional/empático, se expande logicamente para abarcar a ideia igualmente falha de que todo aquele que for mais inteligente, será quase que um polímata, porque terá maiores recursos cognitivos e intelectuais para aprender sobre qualquer assunto, que não se consiste em uma verdade absoluta.
Estamos em perspectivas existenciais individualmente distintas, apesar das similaridades de grupo a que pertencemos. Ao aceitar a real existência de uma diversidade cognitiva, caminharemos por lógica, a começar a entender o porquê das tantas incongruências em termos de ''inteligência'' e ''comportamento''. Por que a grande maioria dos mais inteligentes não são sábios ou ao menos emularem certas atitude típicas de muitos gênios**
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